Não é aceitável uma política do medicamento que enfraqueça os “genéricos” e dificulte o acesso dos cidadãos à saúde.
A CGTP-IN não pode deixar de condenar esta situação lesiva dos interesses do país, do Estado e dos cidadãos, em benefício exclusivo dos interesses económicos de alguns “lobbies” que se movimentam no sector da saúde e exige o cabal cumprimento da lei.
A CGTP-IN reclama do Governo uma política do medicamento mais transparente e mais facilitadora do acesso ao medicamento por parte dos cidadãos. O controle da despesa pública e as dificuldades financeiras do Estado não podem justificar uma política anti-social que afecta os estratos mais débeis da população, não sendo aceitável que os cidadãos vejam diminuídos direitos tão fundamentais.

Comunicado à imprensa n.º 33/05

Não é aceitável uma política do medicamento que enfraqueça os “genéricos” e dificulte o acesso dos cidadãos à saúde

O medicamento é um bem com características especiais bem diferentes de um outro qualquer produto de consumo, cabendo ao Estado obrigações específicas nesta matéria. O que aqui está em causa é o problema muitas vezes de vida ou de morte dos cidadãos e os critérios meramente economicistas e do lucro dos operadores económicos não devem prevalecer face a direitos fundamentais do indivíduo como o do direito à vida e do acesso a medicamentos. O medicamento é fundamental na prevenção da doença e o seu encarecimento pode ter como consequência custos futuros acrescidos nos cuidados de saúde.

Os interesses económicos no sector da saúde e, em especial na área do medicamento, são amplamente reconhecidos e o cidadão tem ficado sempre afastado das preocupações centrais que uma política do medicamento deveria comportar: a facilitação do acesso a medicamentos a preços razoáveis e compatíveis com a situação económica dos portugueses, que como é sabido apresentam os mais baixos rendimentos e os maiores índices de pobreza dos países da União Europeia dos 15.

Em 2004, o mercado total de medicamentos atingia no nosso país cerca de 3 mil milhões de euros (600 milhões de contos), aumentando mais 9% face ao ano anterior. Em 2004, as vendas de medicamentos genéricos rondavam os 235 milhões de euros (47 milhões de contos), aumentando 52% face ao ano anterior.

Nos últimos anos, apesar da oposição de vários intervenientes na área da saúde, tem-se assistido a uma evolução muito favorável do peso dos medicamentos genéricos no total dos medicamentos vendidos no país e isso tem contribuído positivamente para o aligeiramento quer da despesa pública em medicamentos quer da despesa dos cidadãos. Em 2000, a quota dos medicamentos genéricos no total de medicamentos rondava apenas 1%, em 2003 era de 3,4% e, em 2004, era de 7,9%. Entre Janeiro e Julho de 2005, as vendas dos medicamentos genéricos ultrapassavam os 223 milhões de euros (45 milhões de contos), aumentando 85% face aos valores do período homólogo do ano anterior.

Esta evolução favorável dos genéricos ter-se-á devido em grande parte a uma política de incentivo caracterizada por uma bonificação em 10% da comparticipação dos medicamentos genéricos e que foi fundamental para a dinamização e consolidação deste mercado. Ainda assim, é um facto que Portugal permanece muito atrasado nesta matéria, uma vez que em muitos dos países mais desenvolvidos da Europa são normais quotas dos medicamentos genéricos da ordem dos 30 a 40%.

A CGTP-IN expressa o seu desacordo com as alterações introduzidas pelo actual Governo na política do medicamento, uma vez que a eliminação da majoração em 10% da comparticipação dos medicamentos genéricos poderá fazer estancar a evolução favorável dos medicamentos genéricos, e mesmo fazer regredir o peso destes medicamentos em prejuízo dos cidadãos e da despesa pública.

Mesmo a redução em 6% do preço de venda ao público de todos os medicamentos aprovados, a partir de 15 de Setembro, previsto na Portaria nº 618-A/2005 de 27 de Julho, não impede que os cidadãos vejam aumentar as suas despesas com os medicamentos genéricos. E isto é inaceitável, porque torna mais problemático o acesso ao medicamento por parte dos cidadãos.

Acresce que a redução de preços de 6% prevista nos medicamentos poderá ter efeitos limitados e de difícil controlo. Por um lado, sabe-se da dificuldade do Estado na fiscalização dos novos preços e, em particular, dos volumes de stocks que naturalmente a indústria e a comercialização terá interesse sobreavaliar com o prejuízo dos cidadãos e do Estado. Ou seja, a anunciada diminuição de preços, resultante do acordo entre o Governo e a indústria, poderá constituir um logro e o que poderá ocorrer é uma subida generalizada dos preços dos medicamentos, tanto mais que já entrou em vigor a eliminação da majoração dos 10% de comparticipação dos medicamentos genéricos.

A fixação de preços dos medicamentos é uma matéria que permanece pouco transparente. Ainda recentemente, uma associação do sector fazia eco do não cumprimento da lei por parte da indústria, adiantando que “bastaria que a lei que regulamenta a fixação de preços fosse cumprida para que os medicamentos fossem mais baratos, obtendo-se em 2004 uma poupança de 227 milhões de euros, dos quais cerca de 124 milhões representariam uma poupança directa para os doentes”. De facto, o que a lei determina é que o preço dos medicamentos à saída da fábrica não pode exceder o preço do fabricante mais baixo em vigor em Espanha, em França ou Itália e a verdade é que em muitos casos não é isso que se tem verificado, havendo assim, um desrespeito pelo cumprimento da lei.

A CGTP-IN não pode deixar de condenar esta situação lesiva dos interesses do país, do Estado e dos cidadãos, em benefício exclusivo dos interesses económicos de alguns “lobbies” que se movimentam no sector da saúde e exige o cabal cumprimento da lei.

A CGTP-IN reclama do Governo uma política do medicamento mais transparente e mais facilitadora do acesso ao medicamento por parte dos cidadãos. O controle da despesa pública e as dificuldades financeiras do Estado não podem justificar uma política anti-social que afecta os estratos mais débeis da população, não sendo aceitável que os cidadãos vejam diminuídos direitos tão fundamentais.

Lisboa, 2005-09-20

DIF/CGTP-IN