assembleia da republica 9 dbc97As alterações aprovadas na Assembleia da República no âmbito do acordo sobre a descentralização entre PS e PSD comportam uma reconfiguração do Poder Local Democrático e agravarão os problemas de subfinanciamento.

Foi publicado no passado dia 16 de Agosto um conjunto de alterações à Lei das Finanças Locais e a Lei-Quadro de transferência de competências do Estado Central para as Autarquias Locais, através das Leis nºs 51/2018 e 50/2018, respectivamente, no seguimento do acordo sobre a descentralização, que PS e PSD aprovaram na Assembleia da República, no passado dia 18 de Julho, sem qualquer debate sério e que pretende consagrar uma reconfiguração importante do papel do Poder Local Democrático, susceptível de agravar os seus problemas de subfinanciamento no médio prazo.

Fizeram-no sem debater, nomeadamente, com os trabalhadores e as suas estruturas representativas, e sem o consenso que um tema desta natureza exigia, situação tanto mais inaceitável quando estamos perante um processo que comporta uma profunda reconfiguração do Estado no exercício das suas funções consagradas na Constituição, põe em causa os direitos de milhares de trabalhadores e ameaça a autonomia do poder local democrático, pretendendo transferir para as autarquias e entidades intermunicipais um vastíssimo conjunto de tarefas, abrangendo domínios essenciais à vida das populações como são os casos da educação, da saúde, da ação social, da habitação, da cultura, cuja escala de actuação é em muitos casos supramunicipal, visando sacudir para o poder local encargos e agravadas insatisfações das populações pela falta de resposta na maior parte destes sectores.

De forma inaceitável, ignora a necessidade da criação das Regiões Administrativas – quando passam 20 anos sobre o referendo – indispensáveis a uma política efectiva de combate às assimetrias e de desenvolvimento regional, optando por reforçar as CIM – Comunidades Intermunicipais, órgãos sem legitimidade democrática. Tal como ignora a exigência de reposição de freguesias – tendo já rejeitado propostas nesse sentido – cuja fusão e extinção pelo anterior executivo PSD/CDS fizeram aumentar as despesas e o isolamento das populações.

A lei-quadro determina que a transferência deverá iniciar-se em 2019, podendo concretizar-se de forma gradual no limite até 1 de Janeiro de 2021, acompanhada da elaboração de decretos-lei sectoriais, de cujo debate e negociação o STAL não abdicará em circunstância alguma!

As autarquias (municípios e freguesias) que não pretendam assumir em 2019 e em 2020 as competências têm até 15 de Setembro (!) de comunicar esse facto à Direcção-Geral das Autarquias Locais, após prévia deliberação dos seus órgãos deliberativos nesse sentido. Como é óbvio, estes prazos inviabilizam qualquer discussão séria e ponderada de um processo que terá um enorme impacto, pelo que devem ser alterados, a não ser que o objectivo seja mesmo amarrar as autarquias à sua concretização, durante o próximo ano de 2019!

Além de completamente inaceitável, o STAL salienta que, até esta data, não é conhecido qualquer estudo relacionado com a transferência de novas competências e sobre a capacidade estrutural das autarquias para assumirem, sem perda de qualidade do serviço público, as novas competências, que em muitos casos, poderão significar a duplicação do número de trabalhadores actualmente ao serviço de um município. Assim sendo, a questão que se coloca é: como poderão os eleitos locais decidir de forma esclarecida um processo desta natureza?

No plano financeiro, o denominado Fundo de Financiamento da Descentralização, mais não é do que o somatório das actuais e manifestamente insuficientes, dotações dos diversos ministérios, para as enormes carências que todos os dias se fazem sentir. Por outro lado, a lei de finanças locais não só não assegura a recuperação financeira das autarquias, que entre 2007 e 2018, fruto dos cortes, perderam 3,5 mil milhões de euros, como a criação de uma receita adicional de 7,5% incidindo sobre o IVA gerado localmente em relação à restauração, alojamento, energia, água e comunicações, na ordem dos 72 milhões de euros, irá constituir mais um elemento potenciador de assimetrias, na medida em que sairão beneficiados os municípios de maior dimensão.

Para os trabalhadores, a perspectiva é a passagem administrativa, violando o seu direito de opção, o desempenho de tarefas que nada têm a ver com o seu conteúdo funcional, a confusão resultante da duplicação de tutelas, a ameaça da privatização de serviços, com a consequente extinção de postos de trabalho.

O STAL defende há muito que a descentralização é essencial para a melhoria e modernização da administração pública e dos serviços que presta, permitindo uma maior aproximação aos cidadãos. Uma descentralização que, ao contrário do caminho defendido pelo governo, concretize a Regionalização, valorize o Poder Local Democrático, dotando-o dos recursos humanos, técnicos e financeiros adequados, reponha as freguesias, respeite os direitos e assegure a universalidade das funções sociais do Estado como condição da igualdade dos cidadãos, o que só é possível garantir a partir de políticas nacionais.

Por isso, o STAL exige a suspensão deste processo e apela aos autarcas, para que até 15 de Setembro, rejeitem esta transferência em moldes tão «apressados» e que, em conjunto com os trabalhadores e a população, se empenhem na construção de um genuíno, participado e efectivo processo de descentralização que contribua para o desenvolvimento local e para a melhoria da qualidade e condições de vida dos trabalhadores e das populações.

FONTE: STAL