Proposta de OE 2026 – Educação
Irrealista, insuficiente e comprometida com lógicas de destruição da Escola Pública
Numa primeira apreciação, a FENPROF entende que a Proposta de Orçamento do Estado para 2026 confirma, mais uma vez, a desvalorização da Educação em Portugal, tratando-a como uma despesa de pouca relevância e não como um investimento. Deste modo, os aumentos orçamentais alegadamente previstos não estão à altura das necessidades estruturais do sistema e podem, mesmo, representar uma redução, tendo em conta, por exemplo, a inflação e a forma ardilosa como o governo faz os cálculos de um alegado crescimento.
Ainda esta semana dois estudos vindos a público concluíam que há carência de professores e que a carreira docente está desvalorizada, confirmando o que a FENPROF tem dito:
- O ano letivo 2025/26 já arrancou com 3152 horários por preencher, embora 18 899 docentes tenham sido colocados nos concursos. Isso evidencia que o sistema está longe de responder às necessidades efetivas;
- As reservas de recrutamento perderam mais de 13 % de candidatos num só ano — com quedas expressivas em grupos como o 1.º CEB (–27,7 %), Inglês do 1.º CEB (–36,8 %) ou Português/Inglês (–42,3 %) —, o que sugere menor atratividade da profissão docente;
- Em inquéritos feitos pela FENPROF nas escolas, também se registam sobrecargas, excesso de burocracia, incumprimento dos rácios de pessoal não docente e más condições físicas nos edifícios.
Essa situação, manifestando-se já no início do presente ano letivo, tenderá a agravar-se se o OE 2026 não for ambicioso e não inverter o atual rumo de desinvestimento.
Assim, apesar de o discurso oficial insistir no reforço e na modernização do sistema educativo, a realidade é bem diferente, e esta proposta demonstra que, infelizmente, essa situação não se alterará.
O Governo opta por ignorar, pura e simplesmente, esta realidade e não lhe responde adequadamente. Deste modo, a proposta orçamental de 2026 parece prever um aumento de 3,5 % na despesa com pessoal, no setor da Educação, com justificações ligadas à recuperação de tempo de serviço, contratação de novos profissionais e valorização da carreira. Isto significa que, deste montante, grande parte já se encontra “comprometida” por obrigação legal ou por compromissos assumidos. A valorização real da carreira ficará, assim, comprometida se a Assembleia da República não corrigir esta situação.
Facilmente se percebe que, tratando-se de uma proposta irrealista perante os desafios e as exigências que se colocam à ação do governo, é um Orçamento do Estado que confirma o adiamento ou mesmo o não reconhecimento da aposta na valorização da profissão docente ou na criação de condições dignas para atrair e fixar professores. Ou seja, se parte desse aumento já estaria “pré-destinado”, a verba efetiva para valorização acaba por ser menor ou inexistente, como já referimos. Ao mesmo tempo, o prolongamento da negociação do Estatuto da Carreira Docente para 2027 e com produção de efeitos apenas em 2028, como o governo propõe e a FENPROF critica, indica que, até lá, não haverá efeitos concretos para muitos professores. A FENPROF exige que esta negociação ocorra no presente ano letivo, com efeitos já em 2026/2027.
A FENPROF baseia a sua leitura desta proposta de OE nos números do próprio governo:
- integração de 326,2 M€ de fundos europeus no “bolo” global;
- a estimativa do executado revela a existência de 252 M€ não realizados em 2025;
- cálculo do alegado crescimento com base na estimativa do realizado de 2025 e não no orçamentado, falseia os dados e compara o incomparável;
- um crescimento efetivo do orçamentado para 2026 em relação a 2025 de apenas 0,9%;
- redução real da despesa com a Educação, tendo em conta a inflação prevista (2,1%-2,3%).
Cabe aqui perguntar a Fernando Alexandre, que afirmou recentemente que o aumento dos salários é fundamental para captar professores para o sistema: como pretende fazê-lo com a redução da despesa aqui apresentada? E, sobretudo, o que fez aos 252 M€ orçamentados para 2025 e não utilizados?
Mais uma vez, falha-se no essencial: garantir condições dignas para ensinar e aprender.
É um orçamento que transforma a atual retórica sobre a “valorização da educação” num exercício vazio e, na prática, num verdadeiro insulto aos profissionais e às escolas públicas. Existe, assim, uma “retórica de valorização” que não encontra correspondência na realidade, os números apresentados “não batem” com a desejada resolução dos problemas. Desde logo, porque há estudos independentes que a FENPROF confirma e que alertam para o facto de, entre 2026 e 2030, muitos grupos de recrutamento entrarem em défice estrutural, caso nada mude.
Para completar este panorama de destruição da Escola Pública, falta ainda saber que parte do OE2026 estará destinada ao processo de desmantelamento do MECI e à transferência de competências, designadamente para as CCDR. É, igualmente, essencial conhecer o valor alocado ao financiamento do setor privado da Educação, dado que tais opções significarão um novo desvio de recursos públicos que deveriam servir o fortalecimento da Escola Pública e não a sua substituição progressiva.
Em relação à percentagem do PIB alocada à Educação, e tendo em conta o crescimento previsto pelo Banco de Portugal (2,1%-2,2%) para 2026 (com base num PIB de 286.469,4 milhões de euros em 2025), o valor real destinado à Educação ronda apenas 2,6% do PIB. Trata-se de um valor manifestamente insuficiente, que representa menos de metade dos 6% recomendados por organizações internacionais como o Banco Mundial e a OCDE.
Relativamente à despesa com pessoal, o aumento previsto de 3,5% é apresentado pelo Governo como destinado à valorização da carreira docente, à recuperação do tempo de serviço e à contratação de novos profissionais. Contudo, considerando o aumento salarial proposto de 2,15% para a Administração Pública – claramente insuficiente -, e reconhecendo que a recuperação do tempo de serviço e a contratação resultam de compromissos já assumidos, importa questionar: o que sobra, efetivamente, para a “valorização da carreira”?
Em suma, a Proposta de Orçamento do Estado para 2026 confirma a repetição de mais um mau orçamento para a Educação, persistindo em políticas que fracassaram e afastadas das reais necessidades das escolas, dos professores e dos alunos.
Este desinvestimento contínuo na Escola Pública não é um acaso nem um erro de cálculo — é uma opção política deliberada deste Governo, que fragiliza o ensino público e abre caminho à progressiva privatização e mercantilização da Educação.
A FENPROF reafirma a sua exigência por uma educação pública, democrática, inclusiva, e adequadamente financiada.
Fonte: FENPROF