1. ESTRATÉGIA DE DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO E SOCIAL

1.1. A CGTP-IN está empenhada na concretização de uma estratégia de desenvolvimento económico e social do país. A CGTP-IN considera que, num quadro internacional marcado pela globalização capitalista neo-liberal, pelo aprofundamento da integração europeia e pelo alargamento, o país não tem futuro se continuar a apostar num modelo errado de baixos salários, de baixa qualidade do ensino, de falta de qualidade do emprego, desrespeito pelos direitos dos trabalhadores que se traduzem em baixas produtividades e em perdas de competitividade.

1.2. Existe uma fixação obsessiva pelo Governo no equilíbrio orçamental sem uma estratégia de desenvolvimento. Os problemas orçamentais são importantes, mas não devem ser dramatizados. A obsessão com o cumprimento do pacto de estabilidade e crescimento originou a actual recessão e aprofundou os problemas da convergência real do país. O pacto de estabilidade e de crescimento tem um efeito devastador sobre a economia. Num período de recessão económica seria de esperar que a política orçamental impulsionasse a actividade económica. O Governo, ao fazer o contrário, agravou a recessão, com a queda do investimento e a diminuição do consumo. Os efeitos sobre a situação orçamental são desastrosos, como mostra a quebra das receitas. Estamos perante um círculo vicioso em que uma invocada política de rigor orçamental conduz a um menor crescimento e este conduz a perdas de receitas. Para a CGTP-IN trata-se de uma política que beneficiando o grande capital é contrária aos interesses dos trabalhadores e da esmagadora maioria do povo e do país, estando deliberadamente orientada para fazer aceitar cortes nas despesas na perspectiva do enfraquecimento do Estado Social, como mostram as reformas em curso na área social dominadas por perspectivas privatizadoras e assistencialistas, o que conduz a maiores desigualdades sociais na distribuição da riqueza e do rendimento.

1.3. Os trabalhadores têm sido injustamente responsabilizados pelas baixas produtividades (veja-se o Código de Trabalho), o que é injusto porque não controlam os factores de que depende a eficiência económica. Esses factores são tributários, desde logo, de uma especialização produtiva assente em produções de baixo valor acrescentado, que são encaminhadas para mercados pouco exigentes do ponto de vista da qualidade dos produtos. O perfil das exportações continua dominado por produtos pouco sofisticados, sem marca própria e com uma intensidade tecnológica fraca. De um modo geral, os processos produtivos não favorecem a inovação. Em vários sectores há um peso elevado de empresas em regime de subcontratação. Esta especialização produtiva tem constituído a principal razão explicativa do baixo nível salarial, do fraco recurso à incorporação de trabalho qualificado, do fraco peso das actividades de I§D, da dificuldade em desenvolver políticas sustentadas de formação contínua e da chamada informalidade. O não cumprimento pelas empresas das obrigações legais e contratuais (a informalidade) foi mesmo considerada, num relatório encomendado pelo Governo, como a primeira causa da baixa produtividade.

1.4. Uma estratégia de desenvolvimento económico e social tem de assentar na evolução da economia para produções mais exigentes, com maior valor incorporado, e em serviços de maior qualidade. Nesta concepção, a qualidade da nossa força de trabalho representa um factor-chave para o aumento da produtividade e para a sustentação da competitividade. Esta evolução é decisiva para responder aos principais problemas económicos do país, particularmente as baixas produtividades e as perdas de competitividade, melhorar o nível de vida da população e desenvolver o país de um modo sustentado.

1.5. A aposta no sector produtivo, no aproveitamento dos nossos recursos naturais, nomeadamente florestais, agrícolas e piscícolas, incluindo a defesa da Zona Económica Exclusiva (ZEE), e a valorização externa das nossas produções constituem uma condição essencial para o desenvolvimento económico, atacando as causas do persistente défice da nossa balança comercial. A modernização é essencial mas não é por si só suficiente. O país tem uma elevada taxa de investimento, que é superior à da média comunitária, e muitas empresas fizeram elevados investimentos em novas tecnologias. Existe assim um problema sério de eficiência. O investimento tem-se orientado excessivamente para a construção e obras públicas e tem existido uma baixa utilização dessas tecnologias devido a deficiências de gestão e ao facto de não existir uma aposta clara das empresas na formação. Para a CGTP-IN é preciso conciliar uma política de elevado investimento, público e privado, devido aos atrasos do país, com uma política de apoio mais selectiva de investimento, tendo como instrumento o PIDDAC.

1.6. As actividades de conteúdo científico e tecnológico têm um papel crucial numa política de desenvolvimento. Todos os indicadores estatísticos demonstram o atraso português nesta área: a intensidade em I§D é duas vezes e meia inferior à média comunitária; o número de investigadores é muito baixo; as empresas têm uma escassa participação nas actividades de I§D; as designadas outras actividades científicas e técnicas estão pouco desenvolvidas. O sector não empresarial tem insuficientes recursos humanos, equipamentos e recursos financeiros. No caso dos laboratórios de Estado – que deveriam assegurar a intermediação entre a universidades e o sector produtivo – regrediu-se nos últimos 10 anos. Têm-se apostado no ensino superior privado onde nem sequer há I§D. Para a CGTP-IN este é o sector onde existe um maior desfasamento entre o discurso político, que valoriza estas actividades, e a prática. Existem orientações e medidas, que não se reflectem em concretizações efectivas. No plano comunitário, há o compromisso político de alcançar em 2010 a meta de 3% do PIB para investimento em I§D, mas não se vê como o atingir mantendo as actuais políticas. A CGTP-IN defende a concretização de objectivos para uma políticas de médio prazo, o qual terá de passar por um esforço sério do Estado e das empresas nas actividades científicas e tecnológicas, nas suas diversas componentes.

1.7. A investigação é fundamental para a inovação, mas não a esgota. A inovação deve ser entendida como um conceito multidimensional que abarca a aplicação da investigação de base; a adaptação de novas tecnologias; novos processos produtivos; aperfeiçoamento contínuo de produtos e de serviços; novos métodos na organização do trabalho, incluindo a melhoria nas qualificações e nas condições de trabalho. A tecnologia não deve ser vista apenas no seu lado material. A CGTP-IN considera que uma directriz essencial terá de passar por desenvolver uma capacidade endógena para inovar nas empresas. Deve dar importância à interacção de actividades de conteúdo científico e tecnológico com a inovação e a uma melhor difusão e absorção de tecnologias a que hoje se acede com maior facilidade. Esta perspectiva conduz a enfatizar os aspectos organizacionais, por um lado, e a apostar na qualidade do emprego e na qualificação, por outro. O país apresenta défices nestes dois planos.

1.8. São notórias carências importantes na gestão e organização das empresas, que explicam diferenças importantes de produtividade entre empresas que utilizam as mesmas tecnologias e comercializam produtos semelhantes. Para a CGTP-IN, o país não se desenvolverá se não houver, quer uma mudança das políticas governamentais, quer uma mudança de práticas patronais – dominadas pela inércia, pelas actividades de lucro fácil e muitas vezes de carácter especulativo, pelo não respeito das regras da concorrência, pela subsídio-dependência e pela falta de transparência. No plano laboral, exige-se elevar o baixo grau de participação dos trabalhadores nos processos de introdução de novas tecnologias; aumentar o escasso investimento das empresas em formação; difundir as tecnologias através da formação contínua; valorizar a formação de reconversão; travar o recurso pelas empresas à saída precoce dos trabalhadores, em vez de investir na formação.

1.9. É preciso apostar na qualidade do emprego, incluindo a qualificação. Existe um consenso quase generalizado desta necessidade, mas na prática o patronato não tem rompido com uma lógica onde produções pouco exigentes e serviços de fraca qualidade se traduzem na procura de mão-de-obra pouco qualificada. Existem assim poucos incentivos à qualificação; os baixos salários e os horários longos são desincentivadores da qualificação e deterioram a qualidade do trabalho; a precariedade do emprego não estimula a formação. A introdução de novas tecnologias é limitada pelas dificuldades de assimilação decorrentes da escassez da formação. Com frequência, as entidades patronais temem a formação na perspectiva de que o trabalhador será mais exigente em termos de salário e de carreira profissional. Esta lógica tem explicado o pouco sucesso de políticas e de medidas de qualificação e de formação e a falta de empenho na aplicação dos acordos de concertação social de 2001 e 2002. O contexto de maior concorrência internacional tem fortalecido a actual lógica com o argumento de que Portugal se arrisca a perder empregos pouco qualificados. Assim, ainda que exista a nível oficial um discurso sobre a qualificação como um dos factores decisivos para a competitividade, as tendências dominantes vão no sentido do alongamento e intensificação do trabalho, da baixa do custo directo e indirecto do trabalho, num maior recurso a uma imigração pouco qualificada e desprotegida e no debilitamento da contratação colectiva. A prazo uma tal estratégia é suicida. É necessário romper com a actual lógica, utilizando a formação e a qualificação como instrumentos que incentivam a evolução na cadeia de valor dos produtos.

1.10. O desenvolvimento tem de ter uma dimensão regional. Portugal realizou uma convergência, ainda que insuficiente, com o nível de vida médio na U.E., nas últimas décadas, mas esse processo foi acompanhado de persistentes e crescentes disparidades regionais. Os dados dos Censos 2001 mostram que prossegue a desertificação humana em diversas regiões do interior e as perspectivas apontam para a continuação da concentração da população e da actividade económica nas regiões metropolitanas. Acresce que o território nacional inclui duas regiões insulares e ultraperiféricas com dificuldades específicas no seu desenvolvimento em função da respectiva configuração e distância. Este processo agravar-se-á com a redução de fundos estruturais. Existe, por outro lado, um processo de europeização da produção com impactos no investimento directo estrangeiro, na aquisição e fusão de empresa, na subcontratação de empresas e no crescimento de gigantescas cadeias de comercialização. Estas transformações tendem a tornar o crescimento geograficamente mais desequilibrado. Por isso, é necessário que a U.E. tenha uma política regional reforçada, que o estatuto das regiões ultraperiféricas seja efectivamente aplicado aos Açores e Madeira e que as políticas macroeconómicas, no plano nacional e comunitário, sejam orientadas para a coesão económica e social com um desenvolvimento equilibrado das regiões. É igualmente necessário que o país seja dotado dos instrumentos necessários a garantir a execução de tais políticas pelo que se reafirma a necessidade da criação das Regiões Administrativas nos termos em que a Constituição as define.

1.11. Para a CGTP-IN é crucial o papel do Estado no apoio e dinamização do desenvolvimento. Controla mecanismos de redistribuição dos rendimentos que podem reduzir as desigualdades sociais, com ganhos em termos de coesão da sociedade, e gerar recursos necessários à modernização da economia. O Estado tem um papel na fixação de princípios e de regras que orientam a formação da riqueza. Pode influenciar o crescimento económico por via das políticas económicas. Tem um papel fundamental em factores decisivos para o desenvolvimento como a educação e a formação, a saúde, a justiça, a segurança social, a rede de infra-estruturas, a investigação e desenvolvimento, a protecção do meio ambiente e dos recursos naturais, a informação estatística, etc. É vital que exista uma pressão e luta sociais para que o Estado não se demita do papel e das funções que constitucionalmente lhe estão atribuídas e para que se efectuem avaliações regulares e sistemáticas dos serviços do Estado e das políticas públicas. O país precisa de um forte sector público na economia que impulsione o desenvolvimento pelo que o Estado deve manter uma posição determinante em sectores estratégicos fundamentais como o financeiro, a energia, os transportes, a água e as comunicações entre as mais importantes.

1.12. O Estado tem a responsabilidade de buscar ganhos de eficiência no funcionamento das Administração Pública. A eficiência e melhoria da qualidade da Administração Pública são condições necessárias para a existência de um Estado operativo, moderno, descentralizado e desburocratizado, transparente e responsável, instrumento indispensável ao desenvolvimento. Tem de haver uma preocupação com o aumento do valor acrescentado, que neste caso é fundamentalmente constituído pela qualidade do serviço público e a rapidez com que é prestado aos cidadãos e às empresas. Porque ela integra múltiplos domínios de actuação e exerce diversas funções, a visão global pode ofuscar as características e realidades dos diferentes sectores em que se divide. Uma efectiva reforma da Administração Pública que vise aumentar a quantidade e a qualidade dos serviços públicos prestados à comunidade, com menores custos absolutos e/ou relativos e em tempo adequado deve: ter orientações políticas claras e adequadas sobre os serviços públicos a prestar, enquadradoras das actividades da Administração; proceder à reorganização de estruturas pertinentes, de forma a evitar duplicações, a concentrar recursos sem deteriorar a qualidade dos serviços, a combater desperdícios e a simplificar regras e processos; promover maior descentralização, desconcentração e autonomia dos serviços, necessariamente acompanhadas de mais responsabilização, de reforço das capacidades e competências de gestão e de implementação de sistemas de avaliação e controlo; terminar com o clientelismo; reforçar a capacidade dos seus recursos humanos e motivar os trabalhadores. Esta motivação indispensável não é compatível com medidas de congelamento das progressões nas carreiras profissionais e de privatização dos serviços, com políticas persistentes de redução real dos salários ou com o congelamento cego de novas admissões quando elas são comprovadamente necessárias em diversos sectores.

1.13 Uma estratégia de desenvolvimento deve considerar as diferentes formações económicas na realidade portuguesa, não se esgotando no sector privado, como defendem as teses liberais. Deve afirmar o papel essencial do sector público enquanto factor estruturante do desenvolvimento económico e social do país. Deve ainda reconhecer o papel dinâmico do sector cooperativo, bem como da economia social. Esta, pelo seu carácter social voltado para a resolução dos problemas das pessoas, e pelos seus princípios humanistas, escapa, em geral, aos vícios duma economia guiada pela procura do lucro máximo com fins privados. Lutando pela manutenção dos valores solidários que deram origem a este tipo de economia, estas formações económicas podem ser aliadas do movimento sindical na procura duma alternativa à economia capitalista, num espaço de acção solidária na defesa das camadas mais desfavorecidas da população, ainda que, na presente situação, algumas das instituições mantenham práticas laborais baseadas em baixos salários e na precariedade de emprego.

1.14. Uma estratégia de desenvolvimento tem de criar relações diferentes entre o Estado e os cidadãos, rompendo com práticas e com mentalidades que geram atrasos e nos condenam ao declínio. A exigência de ética e rigor impõe que seja o Estado o primeiro a dar o exemplo, o que não se tem verificado. Também não é aceitável que uns paguem impostos e contribuições sociais, essencialmente os trabalhadores, e outros não; que a economia clandestina atinja níveis tão elevados; que Portugal seja um dos países europeus onde é mais alta a não aplicação dos direitos e das disposições da contratação colectiva; que a sinistralidade (laboral, rodoviária) seja uma calamidade nacional; que o patronato apenas se comprometa na concertação social na base de subsídios e depois não cumpra o que acordou; que as empresas, tendo recebido avultados apoios comunitários ao investimento e à formação, continuem a apostar na subsídio-dependência. A fraude e a evasão fiscal e contributiva não são apenas factores de injustiça social – traduzem-se também em baixas produtividades. Um compromisso quanto à exigência de ética e de rigor em todos os domínios constitui um elemento estruturante do desenvolvimento económico e social.

1.15.Nos últimos anos têm-se multiplicado os apelos, vindos de vários sectores da sociedade, incluindo alguns sectores do patronato, no sentido de se construir, a nível nacional, uma acção mobilizadora que permita incentivar a produtividade e a competitividade do país. A CGTP-IN, porque considera a resolução destes problemas fundamental para o desenvolvimento e a salvaguarda dos direitos dos trabalhadores e para o combate à periferização do país manifesta-se disponível e empenhada em discuti-los, na base de conteúdos objectivos, enquadrados em propostas políticas credíveis e socialmente justas e não no contexto de simples declarações de intenções