2.O PAPEL DO ESTADO
2.1 As mudanças na concepção e na organização do Estado
2.2 Os serviços públicos
2.3 As desigualdades e o papel do Estado
2.4 As políticas sociais
2.5 A politica fiscal
2.6. O sistema de justiça
2.7 A Administração Pública

2. O PAPEL DO ESTADO

2.1 As mudanças na concepção e na organização do Estado

2.1.1. O Estado continua a ter um papel essencial nas sociedades de hoje, mas existem mudanças na sua concepção e organização. Estas mudanças resultam do processo de globalização capitalista, do avanço da integração europeia e do predomínio das estratégias e interesses do capital financeiro. Argumenta-se que a globalização torna os Estados-nações fracos face às empresas multinacionais; que os blocos de Estado se sobrepõem aos Estados nacionais; que não é possível sujeitar a imposto os factores mais móveis como o capital; que a regulação macroeconómica é incapaz de assegurar o pleno emprego; que o Estado regulador se substitui ao Estado produtor e prestador; que certas actividades são cada vez mais afastadas da esfera da intervenção política e sujeitas a instituições independentes.

2.1.2 A ideologia liberal assenta na ideia de "menos Estado, melhor Estado". O que se observa, porém, não é tanto a redução do papel do Estado, mas antes a sua reconfiguração segundo a fórmula "menos Estado Social, mais Estado para as empresas". A intensificação da concorrência tem servido de capa ideológica para uma apropriação do Estado pelos interesses privados, o que é particularmente evidente em Portugal, onde um capitalismo menos desenvolvido sempre se refugiou no Estado. Hoje, em nome da competitividade, assiste-se a mudanças que orientam cada vez mais o Estado para o apoio às empresas e cada vez menos para os cidadãos; que põem em causa a função social do Estado e visam fazer apropriar pelo sector privado actividades não mercantis; que direccionam a tributação para os consumidores e desoneram o capital e os lucros; que enfraquecem os mecanismos de redistribuição sob a capa da eficácia económica.

2.1.3 A regulação macroeconómica do Estado sofreu profundas alterações. A participação na moeda única retirou aos Governos instrumentos de política económica, como a política monetária, ou enfraqueceu-os, como a política orçamental. O carácter liberal das políticas económicas prevalecentes na U.E. sacrifica o crescimento, desvaloriza o objectivo do pleno emprego, ainda que reconhecido, desregula e flexibiliza os mercados de trabalho e compromete o desenvolvimento.

2.1.4 O Estado perdeu capacidade de intervenção na economia, devido às privatizações, e de regulação da própria economia. Tem-se reforçado a tendência, iniciada pelos Bancos centrais independentes, para atribuir funções de regulação a instituições, organismos e personalidades sem legitimidade política. É uma evolução perigosa porque retira do controlo democrático funções económicas com consequências relevantes na vida dos cidadãos, contribuindo assim para enfraquecer a própria ideia e princípios estruturantes da democracia. É por outro lado ilusório pensar que um Estado sem meios de intervenção na esfera produtiva e na produção de serviços públicos essenciais tenha capacidade efectiva de regulação face ao poder económico.

2.1.5 Ocorreu um enfraquecimento da função fiscalizadora do Estado. O aspecto mais visível é a economia clandestina, bem patente no elevado volume de fuga e de evasão fiscal e contributiva. Mas esta é uma realidade que, com maior ou menor expressão, se estende a todas as áreas, desde a segurança alimentar, à preservação do património, à segurança nas estradas ou à preservação de recursos florestais, cinegéticos e piscícolas. Este é um problema estrutural com profundas implicações. A chamada informalidade, que se traduz no não cumprimento das obrigações legais e contratuais, foi mesmo considerada, num estudo encomendado pelo Governo, como o principal factor de baixa produtividade na economia portuguesa. É violado o princípio constitucional da igualdade. Os cidadãos só formalmente são iguais perante a lei porque, na prática, o não cumprimento da legalidade não é sancionado, situação que penaliza profundamente os cidadãos com menores recursos, influência e poder económico.

2.1.6. Há também uma evolução perigosa no sentido de perda da autoridade do Estado democrático. Um elevado número de cidadãos tem a percepção que o Estado é impotente face a grupos sociais com poder económico e político. Esta percepção surge apoiada em ideias, às vezes difusas, de uma Justiça que apenas pune os fracos; de leis que não são cumpridas; de fenómenos de fraude e de evasão fiscal e contributiva; da falta de resposta adequada a processos de corrupção; da dimensão da economia paralela; da falta de rigor e ética nas práticas do poder.

2.1.7. Não se avançou com o processo de regionalização e assiste-se à concentração de poderes na Administração Central. As próprias medidas de descentralização não são acompanhadas de correspondentes meios financeiros. Assiste-se, também, a medidas como as designadas comunidades urbanas, que tendem a acentuar a dependência face ao Poder Central.

2.2 Os serviços públicos

2.2.1. A lógica liberal de redução do papel do Estado na economia "menos Estado" tem prevalecido nas opções políticas que vêem sendo desenvolvidas, ao longo do tempo, por governos de diferentes partidos com a privatização quer de empresas (o sector empresarial do Estado) quer de serviços da Administração Pública, o que conduziu no essencial, a um quase completo desmantelamento do sector empresarial do Estado, em confronto com a Constituição que institui a existência de um sector público na economia. Em alguns sectores, uma parte significativa das empresas privatizadas, passou para o controlo do capital estrangeiro, nomeadamente: em negócios envolvendo grupos económicos nacionais; diversas empresas foram desmembradas e algumas extintas; o emprego reduziu-se e precarizou-se e os direitos dos trabalhadores foram postos em causa; empresas privadas de transporte pretendem liquidar atribuições de serviço público; o país não teve os ganhos de eficiência económica anunciados.

2.2.2. A acção privatizadora estendeu-se do SEE à concessão, entrega e privatização de serviços públicos. Portugal é hoje um dos países europeus onde as famílias mais pagam pelos serviços públicos essenciais nomeadamente com a educação e a saúde. Com o Governo PSD/PP pretende ir-se mais longe, abrangendo o sector público administrativo, através de instrumentos como a cessão de gestão, a concessão e a delegação de serviços públicos. Pretende-se generalizar situações que se iniciaram com a concessão da gestão do Hospital Amadora-Sintra e que a experiência tem mostrado ser negativa. No final de 2002, 33 hospitais públicos foram empresarializados. Também na educação, o Governo, através da aprovação de um novo regime de gestão para as escolas públicas, pretende impor um modelo empresarial que lhe permita nomear gestores profissionais e de carreira, alheios às dinâmicas pedagógicas que devem orientar as opções de direcção e gestão escolar. A CGTP-IN considera que estamos cada vez mais numa lógica de uma sociedade a duas velocidades em que os cidadãos têm que recorrer ao sector privado e pagar cada vez mais por serviços, prestados muitas vezes sem qualidade, e a população mais carenciada é empurrada para instituições caritativas ou para serviços públicos de má qualidade.

2.2.3 A ofensiva privatizadora estende-se a serviços essenciais à vida e a serviços básicos como a água, electricidade, saneamento, transportes e correios. Coloca ao serviço de privados meios e recursos da comunidade. Subordina a uma lógica de lucro actividades essenciais do Estado. Torna estes serviços mais caros e prestados com pior qualidade. A tributação tem vindo a crescer. Para além do IVA têm-se vindo a multiplicar as taxas (tratamento de águas, conservação dos esgotos, etc.). Para a CGTP-IN é imprescindível a inversão destas políticas o que passa pelo envolvimento da população e pelo trabalho com organizações de utentes em defesa dos serviços públicos.

2.3 As desigualdades e o papel do Estado

2.3.1. Portugal é o país da U.E. que apresenta profundas desigualdades sociais, onde é maior a diferença entre 20% mais ricos e os 20% mais pobres. Dois milhões de portugueses (20% da população) vivem em risco de pobreza. Daí resultam tensões, mal-estar e violência. A acção do Governo agrava as desigualdades: na injusta política salarial; na distribuição da riqueza; na estigmatização das pessoas com rendimento de inserção social e das pessoas com deficiência e com doenças como o HIV e a tóxico-dependência; no ataque às políticas sociais reduzindo o acesso e a sua qualidade. E há intenções que, a concretizarem-se, tornarão o país mais desigual, como a contra-reforma da Administração Pública, que visa entregar aos privados mais funções sociais; atacar o salário mínimo nacional e reduzir substancialmente o subsídio de doença e do desemprego.

2.3.2 As desigualdades não são inelutáveis e são incompatíveis com o desenvolvimento. Os dados provam que alguns dos países mais desenvolvidos apresentam elevados indicadores de desenvolvimento humano. O Estado tem meios de intervenção: a redistribuição de rendimento por meio da política fiscal; a política salarial e, em particular, o salário mínimo nacional; a política de educação que é um instrumento essencial para assegurar a igualdade de oportunidades; a segurança social, como meio de protecção contra os riscos sociais; as políticas de combate à pobreza e à exclusão social; o Serviço Nacional de Saúde como garantia da universalidade de acesso aos cuidados de saúde.

2.4 As políticas sociais

2.4.1. Vive-se hoje uma ofensiva sem precedentes contra as funções sociais do Estado. No plano ideológico, as forças neoliberais pretendem demonstrar que os direitos e a protecção social são incompatíveis com o crescimento económico e eliminam a capacidade de iniciativa e o incentivo ao trabalho. As forças neo-liberais e conservadoras estão agindo para tornar os direitos sociais, nomeadamente, a segurança social, a saúde e o ensino, em meros produtos de mercado. A universalidade destes direitos transformou os sistemas que os prestam em apetecidas e primordiais fontes de apropriação e acumulação de riqueza para o capital. Por isso, o sector financeiro procura a liquidação da segurança social pública, universal e solidária, e do Serviço Nacional de Saúde para alargar o mercado dos fundos de pensões e de seguros privados, nomeadamente de saúde e as empresas apoderam-se dos sectores geridos pelo Estado Social e procuram livrar-se da função reguladora dos Estados.

2.4.2 As políticas sociais não são incompatíveis com o desenvolvimento. A igualdade de oportunidades é crucial em qualquer sociedade; a redistribuição dos rendimentos torna a sociedade mais coesa, reduzindo a conflitualidade social; a protecção social e a estabilidade no emprego aumentam a segurança das pessoas, o que favorece a mudança. No plano comunitário, a política social europeia, ainda que seja contraditória, tem enfatizado a ideia de que a política social tem uma função produtiva. A Comissão Europeia demonstrou recentemente que a não existência de uma política social tem custos (riscos para os trabalhadores; não integração de imigrantes; perdas de produtividade; menor coesão social; etc.). Contudo em Portugal, tal como noutros países da UE, os Governos não vão nesta direcção.

2.5 A politica fiscal

2.5.1. O sistema fiscal não corresponde ao objectivo constitucional de obter uma "repartição justa dos rendimentos e da riqueza" (art. 103), não corrigindo, como devia, as desigualdades na chamada repartição primária. O nível de fiscalidade global não é exagerado, tendo em conta o desenvolvimento do país e considerando necessidades sociais em áreas como a saúde, a educação, a segurança social, a política contra a pobreza, etc. Para a CGTP-IN, o nível de imposto não pode ser visto numa perspectiva negativa. Um papel mais actuante do Estado com vista a assegurar um maior desenvolvimento do país, reduzir as desigualdades e financiar as políticas sociais, exige medidas fiscais adequadas com vista à obtenção pelo Estado das necessárias receitas.

2.5.2. Porém, o actual sistema é desequilibrado e socialmente injusto. Primeiro, apresenta um elevado peso dos impostos sobre bens e serviços em desfavor da tributação directa sobre o rendimento. Os impostos indirectos representam mais de 40% das receitas fiscais totais – mais de 10 pontos percentuais que a média da UE. Segundo, o esforço contributivo continua a recair essencialmente sobre os trabalhadores assalariados. Os cidadãos de maior riqueza ou de maiores rendimentos suportam uma carga fiscal muito inferior à generalidade dos trabalhadores. Continua por se efectivar o englobamento dos rendimentos. Terceiro, existe um nível muito alto de fraude e de evasão fiscal. Quarto, o sistema tem vindo a ser distorcido por benefícios fiscais injustificados.

2.5.3. A luta contra a fraude e a evasão fiscal exige medidas no plano legislativo e uma fiscalização eficaz, em especial dos faltosos e incumpridores, o que passa por uma maior dotação de recursos humanos qualificados na administração fiscal e pela quebra do sigilo bancário e inversão do ónus da prova. É inaceitável que 2/3 das empresas não paguem sistematicamente qualquer imposto. Uma fiscalização eficaz exige aos serviços da administração fiscal o planeamento da sua actividade e a elaboração periódica de relatórios de execução, que devem ser do conhecimento público. É imperativo dispor de um sistema de informação adequado, incluindo a publicação atempada de estatísticas.

2.5.4. A política fiscal dos dois últimos anos tem acentuado os desequilíbrios e as injustiças. O peso dos impostos indirectos reforçou-se devido ao aumento do IVA. Foi revogada a legislação sobre as mais-valias. Não há progressos quanto ao englobamento de rendimentos. O Governo não combate eficazmente a fraude e a evasão fiscal. Mas avança com uma baixa substancial dos impostos pagos pelas empresas. Para a CGTP-IN não é aceitável que os objectivos da política fiscal sejam distorcidos a favor de concepções redutoras de competitividade. Portugal não tem um nível excessivo de fiscalidade incidindo sobre os lucros. A concorrência com base nos impostos é perigosa porque incita os outros países a fazerem o mesmo. O que é imperativo é tomar medidas para que o IRC seja mais equilibrado e justo, já que a receita está concentrada num pequeno grupo de empresas e mais de 60% dos contribuintes não pagam qualquer imposto. Este imposto está completamente distorcido sendo a sua taxa efectiva inferior em mais de 10 pontos à sua taxa legal.

2.5.5. O sistema fiscal é também distorcido pela multiplicação de benefícios fiscais que favorecem as pessoas com níveis de rendimento mais elevado. A despesa fiscal teve um crescimento elevado nos últimos anos e as práticas abusivas do sector financeiro no aproveitamento das zonas francas, revestem um carácter de imoralidade. Por isso, a CGTP-IN defende que se devem eliminar os benefícios fiscais que limitam a escolha dos cidadãos sobre a aplicação das suas poupanças e beneficiam sobretudo o sistema financeiro pelo proteccionismo que o Estado concede. Devem também ser analisados os benefícios concedidos a outros produtos financeiros, no sentido da sua progressiva eliminação.

2.5.6 A CGTP-IN defende que a política fiscal tem de alargar a base de tributação, fazendo pagar os que o não têm feito segundo os seus patrimónios e rendimentos reais (sejam particulares ou empresas) de forma a reduzir a carga tributária sobre os trabalhadores. Lutará por uma mais adequada repartição entre impostos directos e indirectos, pela redução da tributação sobre os trabalhadores, com rendimentos baixos e médios e pela reposição da taxa de IVA. São imperativas medidas de combate à fuga e à evasão fiscal. Estas medidas têm de passar essencialmente pelo combate à não declaração e à subdeclaração de rendimento; pela publicação de indicadores objectivos de base técnico-científico para as várias actividades económicas; pela aplicação do ónus da prova; pelo alargamento das possibilidades de levantamento do sigilo bancário; pelo cruzamento de dados entre a segurança social e a administração fiscal.

2.6. O sistema de justiça

2.6.1. O descrédito do sistema de justiça, a que crescentemente se assiste, é deveras preocupante, porquanto constitui um espelho da incapacidade do país para garantir a realização dos direitos legais e constitucionais dos cidadãos. Um sistema de justiça que transmite uma imagem de pouco rigor, incapaz de impedir e punir adequadamente as violações do segredo de justiça e que todos os dias é posto em causa na praça pública, é um sistema descredibilizado e que não está em condições de contribuir para o desenvolvimento do país.

2.6.2. A morosidade na resolução dos litígios e o preço da taxa de justiça e das custas em geral, afastam os cidadãos, e os trabalhadores em especial, dos tribunais deixando impunes violações de direitos fundamentais e outros, de cuja concretização a substância do regime democrático depende. Quem perde com todo este estado de coisas são os trabalhadores, os cidadãos em geral e o país; quem ganha são todos os que beneficiam dos atrasos e da descredibilização do sistema, ou seja, os ricos e os poderosos que caindo nas malhas da justiça dele procuram (e quase sempre conseguem) sair impunes.

2.6.3. O recente e brutal aumento das custas judiciais quer no Processo de Trabalho, quer no Processo Administrativo, constitui mais um obstáculo no acesso aos Tribunais e à justiça, por parte dos trabalhadores, dificultando-lhes a efectivação dos seus direitos legais e constitucionais.

2.6.4. A privatização do Notariado, com a transferência dos bens públicos a eles afectos, ameaça tornar-se num processo de enfraquecimento do Estado Democrático, com repercussão na segurança, na certeza jurídica e na confiança dos cidadãos nos actos praticados e que o estado tem o dever de garantir. O aumento que vai ocorrer nos actos notariais (escrituras, reconhecimentos, etc.), quanto mais não seja pela tributação em IVA, representa mais um encargo sobre os cidadãos e constitui uma forma de proporcionar lucros aos Notários privados à custa de serviços que o Estado está obrigado a garantir de forma equitativa. Os aumentos previstos são tanto mais graves quanto, recentemente, os actos notariais e também os registrais mais frequentemente praticados pelos cidadãos em geral foram muito agravados, enquanto os actos praticados pelas grandes empresas desceram de forma abrupta.

2.6.5. Para a CGTP-IN, a existência de um sistema de justiça rigoroso, isento, célere e credível, é fundamental para a realização do Estado de Direito Democrático consagrado constitucionalmente, capaz de cumprir o papel que lhe cabe no desenvolvimento económico e social do país.

 

2.7 A Administração Pública

2.7.1. O Governo e os seus defensores têm difundido através da comunicação social uma visão negativista da Administração Pública e dos seus trabalhadores. Afirma-se que a Administração Pública constitui um dos principais factores impeditivos do desenvolvimento do país; que o número de funcionários públicos é excessivo esquecendo que está dentro da média verificada nos países da OCDE. Enfatiza-se que a despesa com o pessoal é a mais elevada da UE esquecendo que os dados não são comparáveis: os rendimentos nacionais com os quais são comparados dependem dos níveis globais de produtividade e a dimensão e natureza das Administrações Públicas não são idênticas. As próprias medidas tomadas no sentido de modernizar e de desburocratizar a Administração Pública nos últimos anos, mesmo que pontuais e insuficientes, têm sido submergidas por uma intensa demagogia que procura degradar o papel do Estado e a imagem do funcionário público junto da população. A principal mensagem do Governo, declarada ou subjacente, é a de que a uma má Administração Pública se contrapõem bons serviços privados, o que é falso. A verdade é que se existem maus serviços públicos, também há serviços de excelência, como há maus serviços privados.

2.7.2 Os problemas existentes na Administração Pública têm responsáveis. Estes problemas radicam nas políticas seguidas pelos vários governos, com destaque para a concessão de serviços públicos ao sector privado; para a criação descontrolada de institutos públicos de direito privado; para o subfinanciamento e a insuficiência dos investimentos realizados; para a má gestão de dirigentes nomeados pelos Governos.

2.7.3. O Governo PSD/PP empreendeu o que chama uma reforma da Administração Pública. A reforma preconizada pelo governo pretende esconder o seu real objectivo: privatizar os serviços públicos e extinguir as funções sociais do Estado. Os aspectos mais gravosos desta reforma são: a redução das funções do Estado dentro de uma lógica de "menos Estado"; a privatização de funções essenciais do Estado, através da cessão da gestão e da concessão e delegação de serviços públicos; a transferência para o domínio da gestão pública de princípios e de métodos de gestão empresarial; a ausência de concurso público para a escolha de pessoal dirigente, o que abre as portas à partidarização da Administração Pública; a generalização, no futuro, do contrato individual de trabalho. As medidas gravosas de reforma não podem ser desinseridas do ataque que vem sendo feito aos trabalhadores da Administração Pública pelo actual Governo através da veiculação de imagens e de estereótipos sobre os trabalhadores da Função Pública; da redução e, para muitos trabalhadores, do congelamento dos salários; das medidas de obstacularização das progressões e promoções nas carreiras; da redução do valor das pensões. O modelo de gestão empresarial defendido pelo Governo choca-se com diferenças incontornáveis entre serviços públicos e privados: os interesses a prosseguir são do interesse público não podendo subordinar-se às regras do mercado; os meios e recursos são da colectividade e não privados; a gestão pública está sujeita à lei. A qualidade dos serviços é essencial, mas é redutor medi-la por métodos produtivistas.

2.7.4 Para a CGTP-IN, não está em causa a modernização da Administração Pública, o recurso a novas tecnologias, a melhoria dos serviços, a motivação e uma melhor avaliação dos trabalhadores. O problema está no sentido das reformas. A CGTP-IN defende que o objectivo essencial de uma reforma séria tem de ser a qualidade dos serviços prestados. Uma efectiva melhoria dos serviços públicos, no quadro dos princípios estabelecidos na Constituição, exige: