5. A NEGOCIAÇÃO COLECTIVA E O SISTEMA DE RELAÇÕES DE TRABALHO
5.1 A contratação colectiva
5.2 A negociação colectiva europeia
5.3. Diálogo social, concertação e participação institucional
5.4 A acção sindical transfronteiriça
5.5 Os conselhos de empresa europeus

5. A NEGOCIAÇÃO COLECTIVA E O SISTEMA DE RELAÇÕES DE TRABALHO

5.1 A contratação colectiva

5.1.1.O Código do Trabalho tem na contratação colectiva um dos seus aspectos mais gravosos porque mais desequilibradores da actual relação de forças. Esta gravidade persiste mesmo depois das alterações introduzidas na sequência das inconstitucionalidades declaradas pelo Tribunal Constitucional. Mantêm-se normas com as quais o Governo e os patrões pretendem: a faculdade da convenção colectiva estabelecer disposições menos favoráveis que a lei; a adesão individual do trabalhador a uma convenção não outorgada pelo seu sindicato; a caducidade das convenções colectivas; a redução dos direitos dos trabalhadores por decisão arbitral; a discricionaridade (da parte do Governo) no recurso à decisão arbitral, com consequências na discriminação dos trabalhadores e na caducidade das convenções colectivas. Estas normas representam uma intromissão intolerável do Estado na contratação colectiva em benefício do patronato. Um mecanismo de extinção de convenções colectivas tem por objectivo alterar a relação de forças entre sindicatos da CGTP-IN e o patronato, forçando-os a negociar em condições menos favoráveis. Estas normas põem em causa o livre exercício da acção sindical e o princípio de que a contratação colectiva constitui um instrumento de progresso social. Algumas delas são contrárias aos princípios contidos na Declaração Universal dos Direitos do Homem, em convenções da OIT (desde logo a Convenção n.º 87 que é uma convenção fundamental) e às decisões do Comité de Liberdade Sindical. Estes princípios são o fomento da negociação colectiva, o seu carácter voluntário, a determinação pelas partes das condições de emprego, entendidas estas numa forma ampla, a prevalência das normas da convenção colectiva face às do contrato individual de trabalho, a negociação por organizações representativas de trabalhadores (afastando-se os chamados "acordos directos" entre os patrões e grupos de trabalhadores como os não sindicalizados), a não intervenção do Estado na determinação dos níveis de negociação.

5.1.2. A luta da CGTP-IN contra o Código de Trabalho conduziu a resultados significativos. O patronato e o Governo não conseguiram porém a instituição de um mecanismo de extinção de convenções colectivas por via do chamado regime transitório de uniformização, o qual foi declarado inconstitucional. Mesmo não tendo sido declarada a inconstitucionalidade da norma que prevê a caducidade das convenções colectivas que, decorrido o prazo de sobrevigência, não tenham sido substituídas por outras convenções, há que ter em consideração o pressuposto reafirmado pelo Tribunal Constitucional, segundo o qual a caducidade da convenção não impede que os direitos nela contidos se mantenham em vigor no âmbito dos contratos individuais de trabalho celebrados durante a vigência da mesma.

5.1.3. A contratação colectiva mantém todas as potencialidades que sempre teve, ou seja, a constituição de patamares de garantias mínimas, para todos, representa um elemento unificador, um instrumento de manutenção e de estabilização dos direitos adquiridos que propicia a solidariedade entre todos os trabalhadores de empresas ou de sector, importante meio para o avanço da sociedade para patamares de maior justiça social e para o desenvolvimento do país. A resposta ao ataque a estes direitos sindicais fundamentais será a do exercício pleno do direito de greve por todos os trabalhadores e a de uma maior disponibilidade de todos os dirigentes, delegados e activistas para a intervenção sindical, em particular nos locais de trabalho.

5.1.4. Estas disposições estabelecem um quadro com condições, problemas e exigências novas para a intervenção sindical. É preciso desenvolver acções que tenham como objectivo o reforço do poder contratual dos sindicatos na negociação colectiva. A CGTP-IN desenvolverá o seu trabalho na base das orientações aprovadas na Conferência Sindical sobre a Contratação colectiva, realizada em 1 de Outubro de 2003. É preciso, em primeiro lugar, exercer e valorizar a contratação colectiva: conhecer e utilizar os direitos para melhor os defender; conhecer as conhecer os objectivos e intenções do patronato e governo para melhor defender os trabalhadores; valorizar os contratos colectivos em vigor; utilizar a contratação colectiva como meio de progresso nas relações de trabalho. Em segundo lugar, actuar para criar uma relação de forças mais favorável aos trabalhadores: intensificar e desenvolver a luta reivindicativa; ter a iniciativa reivindicativa; melhorar o trabalho de organização e intensificar a acção nos locais de trabalho; deixar bem claro ao patronato que nunca abdicaremos do direito à negociação colectiva. O nosso trabalho coloca maiores responsabilidades aos dirigentes e aos delegados sindicais. É imprescindível o reforço do espírito de trabalho colectivo, que assegure uma elevada coesão do movimento sindical; uma coordenação eficaz de toda a negociação colectiva, em todos os níveis, nomeadamente na CGTP-IN; um esforço de informação e de formação dos dirigentes e delegados sindicais sobre o Código de Trabalho; o reforço das Federações e dos sindicatos de âmbito nacional.

5.2 A negociação colectiva europeia

5.2.1. A negociação colectiva europeia teve alguns desenvolvimentos. Foram feitos várias negociações sectoriais ainda que não se trate de verdadeiras convenções colectivas. A nível interconfederal foram celebrados, desde 1995, três acordos (licença parental, trabalho a tempo parcial e contratos a prazo) que foram transpostos para a legislação dos Estados-membros através de directivas. O acordo de 2002 sobre o tele-trabalho tem uma natureza voluntária o que significa que é aplicado pelas organizações subscritoras segundo as regras por elas próprias estabelecidas. Esta negociação tem sido difícil devido à oposição patronal. As suas disposições apresentam um conteúdo mínimo que, nalguns casos, apresenta um risco real de ser utilizado pelo Governo para fazer regredir a legislação nacional. Para a CGTP-IN, a negociação colectiva europeia pode constituir uma forma adequada de regulação dos mercados de trabalho europeus desde que o seu conteúdo possa fazer progredir a Europa Social numa perspectiva de harmonização no progresso e desde que não ponha em causa normas mais favoráveis nos Estados-membros, pelo que continuará a participar activamente nestes processos.

5.2.2. A realização da União Económica e Monetária (UEM) e a perspectiva do alargamento conduziram a uma intensificação do trabalho com vista a dar respostas no plano da coordenação da contratação colectiva para prevenir o dumping social e a regressão dos direitos e das condições de trabalho. Houve progressos na troca de informação e na definição de objectivos reivindicativos comuns em matérias-chave, como os critérios para os aumentos salariais e a duração do trabalho. O esforço para fixar os critérios para os aumentos salariais procura evitar a concorrência entre os trabalhadores. Diversas federações europeias definiram políticas reivindicativas que abrangeram matérias salariais e a CES adoptou em Dezembro de 2000 uma linha directriz de coordenação das negociações colectivas. A CGTP-IN deverá continuar a acompanhar este trabalho. A definição de uma margem de negociação salarial igual à soma da inflação e a produtividade de cada país, que não põe em causa a necessidade de convergência nos países com salários mais baixos, constitui um progresso. A responsabilidade da negociação colectiva terá que continuar a desenvolver-se à escala nacional o que não prejudica, antes potencia, o desenvolvimento da coordenação no plano europeu.

5.2.3. A CES e as confederações europeias aprovaram um programa de trabalho para o período 2003-2005. Este programa representa o equilíbrio possível entre as reivindicações da CES, para obter normas reguladoras dos mercados de trabalho, e a UNICE que pretende limitar ao máximo quer as directivas quer os resultados negociais juridicamente constrangedores. A CGTP-IN considera que este programa não pode constituir para o patronato um motivo para procurar impedir que sejam adoptadas normas legislativas. Para a CGTP-IN é possível avançar na obtenção de resultados na negociação europeia se desenvolvermos acções e lutas que permitam a criação de uma relação de forças no plano europeu que seja mais favorável aos trabalhadores. O reforço da negociação colectiva nos vários países constitui a condição fundamental para o aumento da pressão sobre o patronato que o obrigue a negociar.

5.3. Diálogo social, concertação e participação institucional

5.3.1. A realidade portuguesa é caracterizada pela multiplicidade de órgãos de participação e de níveis de diálogo, de negociação, de consulta, de participação. Nem todas as formas têm a mesma natureza nem a mesma relevância social. Se considerarmos a influência na formação da decisão, vemos que se vai desde a consulta formal, muitas vezes com a decisão já formada, até aos casos em que a decisão resulta da negociação, como na contratação colectiva.

5.3.2. O funcionamento do diálogo social tem, de um modo geral, evidenciado claras deficiências. Está muito dependente do modo como os Governos o encaram, pelo que está excessivamente dependente dos ciclos políticos. O que os Governos muitas vezes procuram não é tanto a consulta, como um meio de influenciar as decisões, mas a consulta em si, como uma formalidade que dá uma capa de democraticidade, mas não de participação de facto na formação da decisão. Existem órgãos de participação que nunca passaram no papel; noutros, o seu poder real é irrelevante. Os exemplos de diálogo social que funcionam melhor mostram que esta realidade pode ser alterada em consequência de factores como a vontade política e a relação de forças.

5.3.3. A participação no Conselho Económico e Social é relevante já que o CES constitui um órgão de consulta e de concertação nos domínios das políticas económicas e sociais e que participa na elaboração de planos de desenvolvimento económico. As suas funções mais importantes têm a ver com o planeamento económico cabendo-lhe pronunciar-se sobre as grandes opções dos planos de desenvolvimento económico e social, antes de aprovadas pelo Governo, e acompanhar a sua execução. O CES tem tido um papel de relevo na discussão de temas relevantes nas grandes questões económicas e sociais, quer ao nível do debate público, quer na formulação de propostas e de recomendações ao Governo. Permanecem, no entanto, problemas no desempenho das funções legalmente atribuídas com uma fraca eficácia da função consultiva, na medida em que os governos, em regra, não têm em conta o conteúdo dos pareceres e recomendações aprovadas.

5.3.4. É ao nível da concertação social, que existem mais dificuldades. A concertação social é muitas vezes governamentalizada com o objectivo, por parte dos governos, de retirarem dividendos políticos. Os Governos tendem a ver a concertação como uma forma de legitimarem a sua governação – daí que se empenhem na concertação, mas apenas na medida em que obtiverem este objectivo. A CGTP-IN travou um combate duro quer em relação aos conteúdos de acordos de concertação social, que considerámos lesivos para os trabalhadores, quer pela consagração de princípios e regras claras da própria concertação, particularmente na salvaguarda do direito de contratação colectiva. Essa acção conduziu a que em 2000 fosse discutida e aprovada uma nova metodologia de concertação social, sendo consagrado que: os acordos não podem colidir com as matérias que sejam da competência reservada da Assembleia da República; o direito de contratação colectiva tem de ser respeitado; deve-se procurar estabelecer deliberações por consenso; a negociação deve incidir sobre matérias específicas. Foi neste quadro que se firmaram em 2001 três importantes acordos subscritos pela CGTP-IN: sobre emprego, educação e formação; higiene e segurança no trabalho; e sobre a segurança social. As melhorias nos conteúdos e nos procedimentos de concertação social regrediram com o Governo PSD/PP, salientando-se o não cumprimento daqueles acordos. A CGTP-IN manterá a sua posição de ter uma intervenção activa na CPCS que, por um lado, defenda e contribua para a melhoria dos direitos e interesses dos trabalhadores e, por outro, não ponha em causa princípios fundamentais como o direito de contratação colectiva, através da aplicação das regras e dos procedimentos estabelecidos.

5.3.5. A CGTP-IN considera que um diálogo social efectivo não se opõe à contratação colectiva nem a instituições democraticamente eleitas. A acção reivindicativa e a luta dos trabalhadores são o elemento determinante do progresso e da mudança social. A participação da CGTP-IN no diálogo social, na concertação e a nível institucional pode dar um contributo importante para atingir este objectivo. A condição essencial é que haja uma clara vontade política e uma pressão social forte no sentido de valorizar o diálogo social. Dotar os órgãos de participação de meios (instalações, funcionários, orçamentos adequados, etc.) que permitam um funcionamento regular; um sistema de informação adequado. Vivemos numa sociedade de informação, mas, na prática, a informação pertinente escasseia ou não é facilmente acessível. Nem sempre existe informação estatística ou que seja actualizada e de qualidade. Um dos domínios em que nos falta informação é o da avaliação das medidas de políticas que foram acordadas ou concertadas.

5.3.6. A CGTP-IN participa nos vários espaços de diálogo social por direito próprio, com independência e consciência do seu papel na defesa intransigente dos direitos dos trabalhadores, formulando e apresentando as suas próprias propostas, articulando a luta dos trabalhadores nas empresas e sectores. A CGTP-IN avalia o diálogo social tendo em conta a natureza dos conteúdos. Não aceita que o diálogo social seja utilizado para que o patronato, e os governos que o servem, façam legitimar valores e aplicar políticas que são profundamente contrárias aos direitos e aos interesses dos trabalhadores, que precarizam o emprego e aumentam o desemprego e a exclusão social e que visam amputar os sindicatos da capacidade de intervenção na transformação progressista da sociedade.

5.4 A acção sindical transfronteiriça

5.4.1. Existem vários conselhos sindicais inter-regionais, ou transfronteiriços, (CSI´s) ao nível dos vários estados membros. No caso português, há 4 CSI´s: Norte-Galiza; Beiras-Castilha Leon; Alentejo-Extremadura; Algarve-Andaluzia. Nestes conselhos participam representantes sindicais das confederações de Portugal e de Espanha, tratando-se, no caso da CGTP-IN, de dirigentes indicados pelas Uniões.

5.4.2. O objectivo dos CSI’s é o de apoiar os trabalhadores transfronteiriços – os que diariamente ou semanalmente, passam a fronteira para exercerem actividade profissional no outro lado da fronteira - ajudando a remover os obstáculos à livre circulação, garantindo todos os direitos contratuais, sociais e fiscais. As acções e iniciativas globais e sectoriais dos CSI’s (é reconhecido a nível internacional o empenho da CGTP-IN nesta frente de trabalho) têm sido relevantes na protecção e informação dos direitos destes trabalhadores, bem como na troca de informação sindical e direitos contratuais entre as estruturas sindicais sectoriais e mesmo ao nível das mesmas empresas existentes num e noutro lado da fronteira. A CGTP-IN deve continuar a dar a devida atenção e participação empenhada nos CSI’s, garantindo a efectiva divulgação e promoção dos direitos junto destes trabalhadores, reivindicando e propondo as soluções que permitam o desenvolvimento equilibrado das regiões raianas, de forma a prevenir situações de "dumping" social.

5.5 Os conselhos de empresa europeus

5.5.1.A CGTP-IN considera - num quadro de crescente transnacionalização, de reestruturação transfronteiriça e de deslocalização das empresas, tantas vezes com consequências no plano do emprego e demais direitos e garantias dos trabalhadores - que os Conselhos de Empresa Europeus (CEE) constituem um instrumento importante para que decisões e medidas com fortes repercussões sociais não sejam tomadas por multinacionais cujas direcções centrais se encontram instaladas noutros Estados-membros, sem conhecimento e possibilidade de intervenção prévios dos trabalhadores e trabalhadoras afectados nos estabelecimentos dos diversos países. A institucionalização dos CEE corresponde, assim, a uma das possíveis formas de adequação das estruturas sociais de representação dos trabalhadores às mutações operadas nas próprias estruturas e regras económicas, com o objectivo de salvaguardar os direitos e os interesses de quem trabalha em empresas ou grupos de empresas de dimensão comunitária.

5.5.2.No plano europeu, foram criados comité de empresa europeus em mais de um terço das empresas abrangidas e que empregam cerca de 70% do total dos respectivos trabalhadores. A CES reclama a revisão da directiva com vista a reforçar os direitos de informação e de consulta; a estabelecer sanções eficazes; a desenvolver a formação dos representantes dos trabalhadores.

5.5.3.No plano nacional, o processo de institucionalização dos CEE, ou de mecanismos de informação e consulta, deve assentar numa base de cooperação entre as organizações sindicais de sector - Federações e Sindicatos representativos - e as Comissões de Trabalhadores existentes, sendo necessário assegurar o cumprimento das medidas previstas de informação e de consulta.

5.5.4. Para além dos Conselhos de Empresa Europeus, surgiram entretanto novas etapas na representação colectiva dos trabalhadores, nomeadamente através da Directiva que complementa o regulamento que veio instituir a Sociedade Anónima Europeia, na qual se atribui o direito de participação dos representantes dos trabalhadores na definição dos níveis de participação, informação ou consulta e sobre qual o modelo adoptado. A CGTP-IN defende uma intervenção a este nível, que garanta a autonomia de intervenção dos representantes dos trabalhadores de modo a que a sua intervenção vise a defesa dos interesses de quem representa.

5.5.5. A transposição para o direito interno das Directivas que garantem aos representantes dos trabalhadores em todos os países da U.E. e EEE (Espaço Económico Europeu), a informação e consulta relativamente à situação financeira, económica e social das empresas é uma obrigação do Estado português.