A Contratação Colectiva

Intervenção de Amável Alves
Membro do Conselho Nacional

Camaradas,

É antiga a luta dos trabalhadores pela substituição da imposição unilateral da vontade dos patrões nas relações de trabalho, por normas também por si negociadas, onde constem a salvaguarda dos seus direitos, tentando, assim, reduzir a exploração de que sempre foram alvo.

Foi através da tomada de consciência, por parte dos trabalhadores, de que só se poderiam defender se se juntassem e se organizassem em Sindicatos, que poderiam ter êxito, pois só assim poderiam fazer ouvir a sua voz, as suas reivindicações seriam tidas em conta, os patrões seriam obrigados a negociar e teriam uma palavra a dizer na fixação das normas que regulam as relações de trabalho. É esta a razão que está na origem da existência da contratação colectiva, mas é este, também, o princípio do sindicalismo.

Foi através da luta reivindicativa, a partir dos locais de trabalho, nas empresas e sectores, que se conquistaram direitos que hoje existem, por vezes em condições muito difíceis, antes e após o 25 de Abril de 1974. O conteúdo das convenções colectivas, rico em direitos, que apesar da ofensiva desregulamentadora entretanto verificada, mantém-se e é um património valioso, que tem de ser preservado.

As convenções colectivas em vigor, têm de ser assumidas como a base, a partir da qual se vai evoluir para o futuro das relações de trabalho, sem rupturas, pois esta é a condição para se avançar no sentido do progresso.

As referências aqui feitas, nomeadamente o relembrar, embora em breve e incompleta síntese, a história da contratação colectiva e a importância que sempre teve a luta dos trabalhadores para o avanço da sociedade, é para dizer que antes de existir o direito legal à greve, os trabalhadores já faziam greve e antes de o direito à negociação colectiva já negociavam as suas relações de trabalho de forma colectiva.

A luta colectiva dos trabalhadores sempre desempenhou um papel de inovação e de avanço nas relações de trabalho, tendo influenciado de forma determinante a legislação de trabalho. É exactamente essa razão porque ainda hoje existem muitos direitos regulados na contratação colectiva que não constam da lei, como é o caso, por exemplo, do trabalho por turnos.

A Constituição de Abril veio dar a dignidade que se impunha ao direito do trabalho, a contratação colectiva sempre teve o papel na busca de soluções novas, sem esperar pela lei, mas sempre no sentido mais favorável, pois só assim será útil para os trabalhadores.

O desafio que os militantes sindicais estão hoje confrontados, é como evitar o retorno a relações laborais onde o trabalhador volte a estar sozinho perante o patrão, onde este possa impor as suas regras de forma unilateral, isto é, o retrocesso nas relações de trabalho com o aumento desenfreado da exploração. São estas, em última análise, as consequências da proliferação do contrato individual de trabalho, tanto na Administração Pública como no sector privado, com o aumento de empresas sem contratação colectiva, ou com regras impostas unilateralmente, como é o caso de regulamentos postos em vigor, através de despachos, em vários institutos públicos.

A resposta, os sindicatos e os trabalhadores sempre a souberam encontrar, mas, para ganhar a consciência de que sozinhos não podem, mas juntos e em unidade é que têm força suficiente para se defenderem, não se adquire espontaneamente só porque se é vitima, requer trabalho de esclarecimento e de mobilização e, para o efeito, temos de ir ao seu encontro nos locais de trabalho, nas empresas, aliás, não é nada de novo, pois foi sempre assim que fizemos!

Camaradas,

A Contratação colectiva existe hoje, como um valioso instrumento, que terá de continuar a ser utilizado, para a regulação do trabalho, serve para fixar os resultados da negociação colectiva, é também a forma de participação dos trabalhadores garantindo assim a democratização nas relações de trabalho, assegura o progresso social e potencia a solidariedade.

As convenções colectivas são hoje a forma moderna de regular as relações de trabalho, em países desenvolvidos, e são a principal fonte de direitos acima dos mínimos da legislação de trabalho e terão que continuar a desempenhar este importante papel.

Os sindicatos e os representantes patronais, tendo em conta a forma descentralizada como é efectuada a negociação colectiva, e realizada por intervenientes, conhecedores das realidades de cada empresa ou sector, estão, assim, em condições de adequar as convenções às novas necessidades. O que pressupõe a busca de soluções que garantam sempre, que não só sejam tidos em conta os interesses patronais, mas também os direitos dos trabalhadores, encontrando, assim, os equilíbrios necessários.

Sendo defensores da livre negociação colectiva, combateremos com todo o vigor o retrocesso que nos querem impor nas relações de trabalho, é dessa forma que deve ser entendido o Código do Trabalho, através da tentativa de intromissão intolerável do Estado na contratação colectiva com o objectivo claro de servir o patronato.

Não fosse a firme oposição dos trabalhadores através das lutas desencadeadas pelos sindicatos, em vários sectores e empresas, e pela greve geral decretada pela CGTP-IN e realizada em 10 de Dezembro de 2002, o governo PSD/PP teria ido muito mais longe.

Mantém-se, no entanto, entre outras, três intromissões inadmissíveis, no sentido de restringir direitos, através da imposição de regras que fragilizam o direito à contratação colectiva. A caducidade, a arbitragem obrigatória e a redução do direito de greve, através do alargamento dos serviços mínimos a vários sectores de actividade. Até chegarem ao ponto de introduzirem no Código do Trabalho, a "autorização dos sindicatos" negociarem condições de trabalho inferiores à lei, isto é, menos favorável, é caso para dizer – é preciso ter lata!

São as conquistas e direitos consagrados em todo o edifício legislativo progressivo que estão a ser postas em causa pela fúria desregulamentadora da globalização capitalista e neoliberal e que em Portugal tem expressão no Código do Trabalho, em especial no seu objectivo de destruição das convenções colectivas de trabalho.

Os trabalhadores sabem, por experiência própria, que os direitos se ganham a partir da organização e da acção nos locais de trabalho, mas também se podem perder se não forem exercidos e defendidos também nos locais de trabalho, é nesse espaço de organização e de intervenção que deve centrar-se a nossa capacidade de resistência e de luta.

É preciso também afirmar, que antes do direito à greve e da negociação colectiva estarem consagrados na lei, já os trabalhadores o usavam para se defenderem. E é preciso também lembrar que estes direitos são hoje direitos fundamentais constantes da Constituição da República. O seu pleno uso, sem qualquer restrição ou limitações, por parte dos trabalhadores e dos sindicatos é, pois, legítimo.

Camaradas,

Realizámos, recentemente, uma Conferência sobre Contratação Colectiva, cujas conclusões estão actualizadas, estamos em época de intensa acção reivindicativa, nas empresas e sectores, num novo quadro legal. Não havendo respostas únicas, até porque os problemas divergem de sector para sector. O desafio que nos é colocado é de grande responsabilidade, defender os direitos constantes das convenções colectivas e as próprias convenções colectivas.

Importa, no entanto, estar preparado para esta importante batalha, é preciso mobilizar os trabalhadores para lutarem pela defesa e melhoria dos seus direitos e pelas reivindicações salariais, mas também é preciso conhecer a realidade de cada empresa e/ou sector, procurar soluções, estudar os problemas, discutir propostas com os trabalhadores, fazer, enfim, o que sempre fizemos, encontrar respostas novas para novos problemas, ou não foi sempre assim a Contratação Colectiva?

Hoje, os trabalhadores estão confrontados com uma violenta ofensiva contra os seus direitos. Em nome da redução do deficit público, o governo reduz os salários reais dos trabalhadores da Administração Pública, são-lhes retirados direitos, precariza-se o vínculo laboral e são maltratados e ofendidos na sua dignidade, como se fossem os culpados de todos os males deste país.

As chamadas reestruturações das grandes empresas mais não são do que a forma encontrada para despedir milhares de trabalhadores, com o nome de rescisões amigáveis, aumentando, assim, o número de desempregados em Portugal.

Aumenta-se o custo de vida, nomeadamente os bens e serviços de primeira necessidade, simultaneamente reduzem-se os salários reais, através do seu crescimento inferior à inflação.

Os argumentos poderão ser novos, mas as pretensões, essas, já os trabalhadores as conhecem desde sempre, aumento da exploração dos trabalhadores.

É, portanto, imperativo para todos nós, o empenhamento no esclarecimento e na mobilização dos trabalhadores, nos locais de trabalho, nas empresas e nos sectores. Por melhores salários, contra o aumento do custo de vida, pelas reivindicações de melhores condições de trabalho, pela defesa dos direitos da contratação colectiva e contra o Código do Trabalho.

A contratação colectiva, mantém todas as potencialidades, como sempre teve de fixar os direitos alcançados pela luta reivindicativa dos trabalhadores e preservá-los para o futuro e ser também o instrumento de modernização das relações laborais, no sentido do progresso social.

Antes de terminar queria, em nome do Conselho Nacional, dirigir uma calorosa saudação a todos os dirigentes, delegados e activistas sindicais, mulheres, homens e jovens, que, de uma forma abnegada e solidária, dão o melhor de si, na luta pela defesa dos trabalhadores, por vezes em condições difíceis, nos locais de trabalho, e nas empresas, prestando assim um inestimável serviço não só aos trabalhadores, mas também à democracia e ao progresso da sociedade.

 

VIVA O 10.º CONGRESSO!

VIVA A CGTP-IN!

Lisboa, 30 e 31 de Janeiro de 2004