CGTP-IN
O Livro Branco
dionisio2JOAQUIM DIONÍSIO
Membro do Conselho Nacional

JOAQUIM DIONÍSIO

Membro do Conselho Nacional

 

 

Camaradas,

O nosso XI Congresso realiza-se num quadro político, económico e social de grande complexidade, em que o desequilíbrio entre o económico e o social, em particular as relações de trabalho, assume uma gravidade sem precedentes próximos e que ameaça a própria democracia.

 

Estamos, camaradas, em presença da maior, mais profunda, estruturada, sustentada e global ofensiva contra os direitos sociais que a concretizar-se colocaria os direitos dos trabalhadores uma centena de anos atrás fazendo-os recuar a tempos próximos do contratualismo liberal do século XIX. È nesta ofensiva que se insere o ataque ao princípio do tratamento mais favorável e ao direito do trabalho enquanto ramo de direito dirigido à protecção do trabalhador.

 

Tal ofensiva sustenta-se na expressão equívoca e mentirosa de flexigurança por detrás da qual o patronato e os seus apoios se escondem (ou pretendiam esconder-se) para atacar os direitos dos trabalhadores.

 

A este propósito, fomos brindados com o chamado Livro Branco. Trata-se de um produto destinado a abrir caminho a uma alteração ao Código do trabalho com vista à acentuação dos seus aspectos mais gravosos.

 

Trata-se de um documento que, curiosamente, se apresenta como algo contraditório.

 

Contraditório porque, por um lado, faz uma apreciação negativa da aplicação do código, mas, por outro, preconiza a acentuação dos mesmos traços que determinam apreciação negativa.

 

Com efeito, o chamado Livro Branco conclui, por um lado, que todos os indicadores sociais pioraram, que a unilateralidade e a individualização das relações laborais, aumentaram, que as injustiças cresceram, que, em suma, a posição patronal se fortaleceu e que as relações laborais são hoje, 4 anos após a entrada em vigor do Código de Trabalho, mais desequilibradas a favor do patronato, que a precariedade cresceu e que a qualidade do emprego piorou; e conclui ainda que os trabalhadores reconhecem nos sindicatos os seus melhores defensores, apesar de muitos não se sindicalizarem, digo eu, com receio das represálias patronais.

 

Ou seja, o Livro Branco conclui (embora não o assuma de forma explícita) que a linha flexibilizadora e desregulamentadora empreendida pelo Código do Trabalho constitui um rotundo fracasso se visto à luz de todos os argumentos apresentados pelos seus defensores. Uma análise séria dos efeitos nefastos do Código no mundo do trabalho deveria levar o Governo a arrepiar caminho e a dar razão aos sindicatos, reconhecendo que a resolução dos problemas do país é indissociável da resolução dos problemas dos trabalhadores.

 

 Todavia, a comissão do Livro Branco (comissão que é da responsabilidade exclusiva do Governo) não tirou as ilações que a sua própria análise determinaria.

 

Bem ao contrário. Bem ciente da missão que lhe foi confiada, a comissão veio propor mais do mesmo:

Ø  A subversão do princípio do tratamento mais favorável, transformando-o em excepção, quando ele foi sempre e deverá ser no futuro uma regra a seguir. E como faz a comissão esta subversão? Seleccionando as matérias que ficariam dentro, e pela negativa aquelas que ficariam fora, da aplicação daquele princípio. Para a comissão o tratamento mais favorável seria uma questão de quantidade de matérias, de contabilidade, sendo certo que o princípio deixaria de existir como tal.

Ø  O desaparecimento da fixação, por lei, dos limites à duração diária e semanal dos horários de trabalho, num processo de desregulação nunca visto, que a concretizar-se, tornaria a vida das famílias dependentes da vontade e até dos humores patronais remetendo para o esquecimento a conciliação da vida profissional com a vida familiar.

Ø   A eliminação da disposição legal que impede que à redução de horários corresponda igual redução dos salários. Ao mesmo tempo propõe a supressão do limite horário do trabalho a tempo parcial.

 A eliminação destas duas disposições legais em conjunto (diz a comissão que são desnecessárias) significaria que um trabalhador que visse reduzido o seu horário de trabalho de 40 para 35 horas (por exemplo) poderia ver igualmente reduzido o seu salário na mesma proporção. Em consequência poderíamos passar a ter contratos a tempo parcial até 39 horas semanais (em média) como a correspondente redução proporcional dos salários. Com esta alteração estaria encontrada a fórmula mágica de às reduções de horário passar a corresponder a redução proporcional do salário.

 

Que o despedimento se torne mais fácil, mais barato e certo, ainda que seja ilícito. A solução encontrada pela comissão é o “aligeiramento” dos procedimentos prévios ao despedimento (Proc. Disciplinar) e a transferência, para o Estado, de parte dos custos dos despedimentos efectuados sem justa causa, ou propondo a inclusão do despedimento por inaptidão, dentro do conceito de despedimento por inadaptação. E o que significa despedimento por inaptidão? Trata-se de mais um motivo de despedimento, manifestamente inconstitucional, que passaria a permitir o despedimento sem justa causa na base de uma alegada incompetência do trabalhador.

 

Com introdução deste novo motivo de despedimento todos podemos adivinhar o que aconteceria aos trabalhadores mais exigentes.

 

E, finalmente, a comissão propõe a eliminação das Convenções Colectivas. A forma prática encontrada, para impor a posição patronal, é a extinção de todas as convenções com dez anos de existência.

 

O Livro Branco, que pretende aplicar a flexigurança no nosso país, é um documento que mostra um Governo com dupla personalidade; um Governo com duas caras; um Governo cínico. Se assim não fosse não se escondia por detrás de uma comissão fortemente governamentalizada e com um peso igualmente significativo da CIP. Mas, camaradas, nós percebemos (ainda que não aceitemos) que o Governo se esconda por detrás da sua comissão; esconde-se porque não quer afrontar, de cara aberta, a luta inevitável e justa dos trabalhadores e do movimento sindical; esconde-se porque não quer assumir os seus compromissos e os compromissos assumidos pelo PS durante a campanha eleitoral e durante o debate e a votação do Código de Trabalho.

 

A ofensiva é vasta atingindo, como sabemos, diversas áreas da vida dos trabalhadores em simultâneo. É por isso que ela é grave, extensa e de uma violência extrema atingindo não apenas os direitos dos trabalhadores, mas também os instrumentos que lhe permitiriam exercê-los. É por isso que ela exige tanto do movimento sindical.

 

A Inspecção do trabalho está anestesiada, quase deixou de sancionar as infracções por mais graves que elas sejam; passou a ser pedagógica em vez de sancionatória e a avisar em vez de fazer cumprir.

 

Convivemos com uma justiça extremamente cara e inacessível à maioria dos trabalhadores portugueses. Um sistema de apoio judiciário e de custas que ignoram ostensivamente o princípio constitucional de acesso ao direito e aos tribunais em condições de igualdade. Em suma, um sistema que produz uma justiça discriminatória em razão do poder financeiro de cada um.

 

A CGTP-IN reclama um sistema de apoio judiciário conforme com a constituição e um regime de custas que isente os trabalhadores nos processos de trabalho.

 

Não reclamamos de mais, queremos aquilo que é justo. E queremos aquilo que o Governo prometeu e ainda não cumpriu. Queremos, afinal, que o sistema de justiça seja assumido como um serviço público e não um instrumento dos mais ricos.

 

O Código de Trabalho foi apresentado aos portugueses como o remédio para todos os males. Desde os males da economia, até aos males existentes no mundo do trabalho. A partir dele tudo mudaria para melhor. As leis passariam a ser cumpridas e o país entraria na senda do desenvolvimento e do progresso, com grandes benefícios para os trabalhadores.

 

Tal como então denunciamos nada disso aconteceu. Hoje o país está mais pobre e os trabalhadores vivem pior.

Por isso, em face da ofensiva que se desenha só nos resta uma opção: A luta contra esta ofensiva com a certeza que esta é uma luta justa e uma luta boa. Justa porque se destina a fazer mais justiça no trabalho; e boa porque dela resultará a derrota de uma política desastrosa que é má para o país, que é má para os trabalhadores e que é má para todos os portugueses.

 

VIVA O XI CONGRESSO!

VIVA A CGTP-IN!

 

Lisboa, 16 de Fevereiro de 2008

 
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