Uma Educação de qualidade numa Escola democrática e respeitadora dos seus profissionais

nogueira2 MG 1983Intervenção Mário Nogueira

Membro do Conselho Nacional

Uma Educação de qualidade numa Escola democrática e respeitadora dos seus profissionais

Camaradas,

Chegar aqui não foi fácil e chegámos com o orgulho de pertencer a um movimento sindical que, em tempo tão complexo e difícil, nunca baixou os braços. Lutámos quando todos lutaram, como lutámos quando muitos já tinham desistido. Nunca deixámos a direita em roda livre e viemos para a rua até ao dia em que ela foi afastada do poder. Aquele inesquecível dia 10 fez com que, de novembro, não fiquem apenas más recordações.

Reservámos a rua para o protesto e nela repetimos que as políticas de direita não são inevitáveis. Demonstrámos que há alternativa. E como a comunicação social nos rejeita o espaço que a democracia impõe, soubemos usar a rua, os espaços institucionais e os locais de trabalho como tribunas da nossa palavra, a par de locais da nossa luta. Nunca baixámos os braços, repito, porque isso não é ação, nem tão-pouco reação, mas apenas inação. A CGTP não pratica esse tipo de inércia!

E se assim é a CGTP, assim são as suas organizações sindicais e a FENPROF não é exceção.

Nestes quatro anos, lutámos em convergência com organizações de trabalhadores do privado e do público, mas foram também muitas as lutas específicas que desenvolvemos, algumas prolongadas no tempo. Realizámos uma das mais duras lutas de sempre, mantendo, durante três semanas, uma greve às avaliações de final de ano. Com ela, obtivemos resultados importantes evitando o agravamento do horário de trabalho por força da imposição das 40 horas e reduzindo ao mínimo o impacto da requalificação. As greves, manifestações, vigílias, concentrações, abaixo-assinados ou petições que promovemos tiveram sempre objetivos bem definidos e, apesar dos níveis de participação terem sido diversos, a nossa luta permitiu que a sociedade compreendesse os problemas existentes e a importância de os resolver.

Não surpreendeu, por isso, que nas primeiras medidas aprovadas pelo atual governo, muitas tivessem a ver com os professores: o fim da PACC, prova com que Crato afastou milhares da profissão, das bolsas de contratação pelos diretores, do ainda mal explicado negócio feito com a Cambridge e também o fim dos exames de 4.º e 6.º anos.

Num plano mais geral, valorizamos o fim da requalificação e o regresso de quem já estava afastado, a reposição salarial em 2016, a eliminação da sobretaxa de IRS em dois anos e o já aprovado retorno às 35 horas semanais.

Valorizamos estes ganhos porque a nossa luta merece ser valorizada. São ganhos que dela resultam e aos quais também não é alheia a existência de uma maioria parlamentar diferente para a qual contribuiu, e muito, a nossa ação.

Uma maioria e uma convergência que se saúdam, pois sabemos o que são governos do PS com maioria absoluta ou apoiados à direita. Mas se a convergência PS, PCP, PEV e BE aumenta a possibilidade de as nossas propostas serem acolhidas, ela também aumenta a nossa responsabilidade. Exige-se que continuemos a construir propostas e a lutar em sua defesa, se queremos que se desenvolvam políticas favoráveis aos trabalhadores.

Em Educação, contudo, não contam apenas os direitos e interesses dos profissionais. Há uma luta que deverá unir todos os trabalhadores: a luta em defesa de uma Escola Pública de qualidade, para todos e inclusiva, ou seja, da Escola Democrática.

Destruir a Escola Democrática é, desde sempre, objetivo maior da direita. Persegue-o há muito e, em 2004, esteve perto de o concretizar quando o então ministro David Justino fez aprovar no Parlamento, com os votos de PSD e CDS, uma lei de bases da educação que revogava a Lei de Bases do Sistema Educativo, de 1986, que estabelece a matriz da Escola Democrática. Felizmente, o então Presidente Jorge Sampaio vetou aquela lei da direita. Daí para cá, Justino, o ideólogo, nunca desistiu de combater a Escola Democrática e hoje, doze anos depois, é um importante operacional da direita, tanto sem sede partidária, que é a sua casa, como em outras sedes onde se exige postura diferente.

Já mais recentemente, a reforma do Estado, verdadeiro manual de destruição das funções sociais do Estado, logo, também da Escola Democrática, desenhava o edifício:

- um pré-escolar eminentemente social;

- um ensino básico organizado para selecionar, daí os exames de 4.º e 6.º anos, e para separar, daí os vocacionais a partir do 7.º;

- o empobrecimento curricular, centrando-se o currículo no ler, escrever e contar e, nas escolas públicas, no treino de algumas destrezas;

- a entrega de competências aparentemente desajustadas aos municípios, mas adequadas a uma escola pública de respostas mínimas;

- o desvio de alunos com dificuldades, necessidades especiais ou deficiência para ambientes de segregação;

- a entrega a operadores privados das respostas de qualidade, dando-lhes a liberdade de escolherem os alunos e transformando o "monstro estatal" em vaca sagrada de cujas tetas recusam tirar a boca;

- um ensino superior a duas velocidades, uma para os filhos das elites, outra para os da classe trabalhadora que teriam acesso a meias licenciaturas, isto é, a cursos superiores sem grau académico.

É essa escola reprodutora das injustiças sociais que a PSD e CDS querem garantir, daí que os papagaios e araras da direita reajam com dureza perante sinais de alguma mudança. Não os preocupa o fim da PACC, do PET ou das BCE, que nem sabem bem o que é. Preocupa-os é que esse seja o prenúncio de medidas mais profundas que travem o curso que tinham destinado à Educação. E é o medo de mudança que os leva, de novo, a falar em pacto que a evite. Para eles, importante é deixar tudo como à direita serve: os privilégios ao privado, a ingerência de alguns autarcas e o autoritarismo do diretor. Para eles, problema é que alguém transforme a Escola Pública num lugar em que a pedagogia prevalece, o conhecimento está ao alcance de todos, as capacidades são desenvolvidas, as competências construídas e, corolário de tudo isso, a democracia faz parte da formação integral do indivíduo. Para a direita, nada pior que uma escola democrática a formar cidadãos de corpo inteiro e a contribuir para a consolidação da sociedade democrática.

Também na Educação, é ainda cedo para perceber o projeto do governo e o Orçamento do Estado não nos alivia a preocupação. Mas como é de pequenino que se torce o pepino, é já agora que teremos de propor, de insistir, de pressionar e de continuar a lutar pela Escola Democrática.

Como canta o Palma, enquanto houver estrada para andar, a gente vai continuar. Continuaremos, porque temos estrada para andar e sabemos onde ela nos levará. Trilhando este caminho, chegaremos, e nenhum aviso o irá evitar, à terra dos sonhos em que toda a gente trata a gente toda por igual.

Viva o XIII Congresso da CGTP

Almada, 26 e 27 de Fevereiro de 2016