WhatsApp Image 2020 10 29 at 18.22.17A CGTP-IN apresentou hoje, no âmbito do programa comemorativo do seu 50.º aniversário, o terceiro volume do livro Contributos para a História do Movimento Operário e Sindical: 1990-2003, na Casa do Alentejo, em Lisboa. Isabel Camarinha, secretária-geral da CGTP-IN, interveio na sessão.

Escrito por dirigentes que acompanharam de perto, na CGTP-IN, nos sindicatos, nas uniões, nas federações, nos vários sectores de actividade, as lutas, as iniciativas, os acontecimentos nele abordados, o livro sintetiza e caracteriza no seu subtítulo – “Anos de Saque ao Sector Público e Roubo de Direitos Laborais” – o período cronológico em que se situa, 1990-2003.

Nas dez partes que lhe dão forma, estão contempladas as grandes questões políticas, económicas e sociais que marcaram treze anos de acção sindical protagonizada pela CGTP-IN, a redução do tempo de trabalho, nomeadamente a luta pelas 40 horas semanais, a participação da Central na Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS), a defesa das funções sociais do Estado e da justiça fiscal, a criação da Escola Profissional Bento de Jesus Caraça (EPBJC), as relações internacionais dos trabalhadores portugueses, os congressos, a organização sindical e a compra da sede histórica da CGTP-IN. A última parte põe em evidência as ideias-chave que, no ano em que a CGTP-IN celebrava o seu 25.º aniversário, em 1995, transpareciam dos debates sobre o tema do sindicalismo, problematizando a sua actualidade no caminho percorrido pelo movimento sindical desde o início da década de 1990. Várias imagens de arquivo testemunham algumas das lutas e iniciativas referidas ao longo da obra.

Recordamos que os dois primeiros volumes foram publicados em 2011 (Contributos para a História do Movimento Operário e Sindical: das Raízes até 1977) e em 2016 (Contributos para a História do Movimento Operário e Sindical: 1977 a 1989).

A apresentação deste terceiro volume integra o programa comemorativo do 50.º aniversário da CGTP-IN, formalmente assinalado a 1 de Outubro. Das várias iniciativas realizadas, evocamos, a título de exemplo, a exposição comemorativa que esteve patente ao público na praça Luís de Camões, em Lisboa, entre 28 de Setembro e 15 de Outubro, e que estará em itinerância pelo país em datas e locais a anunciar.

 

 

Intervenção de Isabel Camarinha
Secretária-geral da CGTP-IN

Caros convidados, camaradas,
Antes de mais agradeço, em nome da CGTP-IN, a vossa presença no lançamento do terceiro volume dos “contributos para a história do movimento operário e sindical”. Uma iniciativa que se insere nas comemorações dos 50 anos da CGTP-IN, herdeira da luta de gerações e gerações de trabalhadores que desde o século XIX resistem e actuam pela conquista de direitos, por um país soberano e desenvolvido.
Agradecemos de forma especial aos autores da presente obra, aos que deram o seu testemunho e ajudaram neste processo colectivo que é o de expor a nossa história, não deixando exclusivamente a outros, o importante papel de divulgar aquilo que somos, de onde vimos e como lidámos com os desafios com que, a seu tempo, fomos confrontados.
Este valioso trabalho realizado por solicitação e com a participação da direcção que cessou as suas funções no XIV Congresso, foi elaborado, entre outros, por dirigentes que, tendo cessado funções, continuam a dar um inestimável contributo militante e assim transmitem a sua experiência na vida sindical, construindo um repositório histórico delutas, factos e acontecimentos que viveram, transmitindo a sua leitura e considerações.
Com o III volume dos contributos para a história do movimento operário e sindical que agora publicamos, damos sequência a um trabalho que nunca vai estar terminado e a que daremos continuidade, porque todos os dias milhares de dirigentes, delegados e activistas sindicais, com a sua intervenção e persistência, agem para reforçar a unidade, organização e luta dos trabalhadores, a força essencial que faz a história.
O período que agora abordamos é marcado, no plano mundial, pelo desaparecimento da URSS e por todas as consequências que tal processo implicou para o mundo do trabalho e para a sociedade como um todo.
Lembramo-nos todos das promessas de paz, de desenvolvimento, de harmonia, do fim da história e de como o capitalismo haveria de resolver os problemas com que a Humanidade estava confrontada.
Sabemos todos o desfecho de tais promessas, da falácia, da deturpação e da mentira que foi propalada a sete ventos. O mundo não está mais seguro e em vez da paz proliferam os conflitos armados; a prosperidade apregoada deu lugar a desigualdades crescentes e gritantes; no lugar do desenvolvimento harmonioso, intensifica-se a exploração. O capitalismo, vendido como modelo perfeito, condena à miséria, à fome, ao êxodo forçado, milhões de seres humanos, apesar da riqueza produzida ser suficiente para resolver os problemas com que os povos se debatem.
Resultado das suas contradições internas, sistémicas, o capitalismo confirma-se como sendo o problema, e não a solução que os trabalhadores e os povos ambicionam e a que têm direito. Num quadro de aprofundamento da sua crise estrutural, o capital recorre a velhos instrumentos para tentar manter os seus privilégios. Crescem movimentos fascistas, altamente financiados pelas oligarquias financeiras, contando sempre com ampla cobertura mediática.
No livro que agora apresentamos, retratamos algumas das mais significativas lutas, organizadas sobretudo a partir dos locais de trabalho, pelo emprego contra o encerramento de empresas; pelo sector público, contra as privatizações; pelos direitos, contra a precariedade; pela contratação colectiva e o aumento dos salários, contra a exploração; pela defesa das funções sociais do Estado, contra a sua degradação.
Os trabalhadores e o povo depararam-se com as consequências da segunda revisão constitucional, que realizada em 1989, marca todo o período do III volume. PSD, PS e CDS escancararam as portas à destruição completa da Reforma Agrária com a entrega da terra aos velhos latifundiários e à entrega do SEE ao capital, alienando as principais empresas nacionalizadas com a Revolução e que foram um instrumento para o desenvolvimento do país.
Foram anos de saque, de espoliação e de avanço do capital. De processos envoltos numa gigantesca operação de propaganda com a apresentação de objectivos nunca cumpridos.
O tempo que decorreu permite-nos afirmar que as privatizações, ao contrário do que então afirmavam os seus promotores, foram e são um saque que deixou em piores condições os trabalhadores, as populações e o país.
Para o sector financeiro, ao invés de este dar um contributo ao financiamento do país, temos uma situação em que anualmente são canalizadas verbas astronómicas do erário público;
Nas comunicações, a PT que há pouco tempo era um centro de excelência na investigação, foi destruída e transformada em Altice...
Em inúmeros sectores e empresas, do cimenteiro, à construção e reparação naval, do energético, à siderurgia, do serviço postal à indústria extractiva, temos sectores totalmente destruídos ou fragilizados, pagamos mais de electricidade que a média da U.E., deixámos de produzir cá dentro para importar lá de fora, com as consequências nos diversos planos que tal situação provoca, desde logo ao nível da soberania e independência nacional.
Poderíamos ainda dar o exemplo do sector dos transportes, em que a privatização da Rodoviária Nacional deixou faixas do território sem transporte, contribuindo assim para a desertificação com todas as implicações ao nível da coesão territorial, a que se junta o desinvestimento na ferrovia.
Estes são alguns dos muitos exemplos do dano causado pelas privatizações, que encheram os bolsos aos grupos económicos nacionais que serviram de intermediários entre o Estado e o capital estrangeiro que hoje domina empresas e sectores que foram, e são, essenciais ao desenvolvimento do país.
É também deste período a conquista no campo da luta secular pelo tempo de trabalho. Fruto de uma luta permanente, as 40 horas e a consideração das pausas como tempo normal de trabalho são consagradas, culminando assim um longo processo reivindicativo, demonstrando a validade da luta e a necessidade de persistência e tenacidade no seu desenvolvimento.
A 10 de Dezembro de 2002, catorze anos depois, realizou-se novamente uma Greve Geral, a 4ª após a Revolução. Poderosa demonstração de força e vontade dos trabalhadores, lutámos contra o Código do Trabalho do PSD\CDS a que podemos juntar o PS, que em 2002 lhe fez oposição, mas nos anos seguintes, já no Governo, lhe deu seguimento e aprofundou alguns dos elementos mais negativos que a legislação laboral contém.
Uma legislação laboral que, tal como na altura denunciámos, veio agravar a precariedade, bloquear a contratação colectiva e impor novas formas de acentuar a velha exploração do capital, com a individualização das relações laborais.
Data também desta época a entrada em circulação do euro que, ao contrário do que então era referido, veio incrementar a dependência externa, acumular a divergência dos países ditos periféricos com os do centro e norte da Europa e contribui de forma decisiva para a longa estagnação económica que marca o início do euro até aos dias de hoje.
No plano interno, foram anos de consolidação do nosso projecto sindical, da aquisição da Sede, mas também da criação da EPBJC.
O terceiro volume, mas também os dois que o antecedem, são fundamentais para entender o momento presente, para aferir a forma como respondemos à ofensiva contra os direitos, como fomos persistentes, como mobilizámos em condições particularmente adversas, como lutámos e não nos resignámos. Neles encontramos muita da riqueza da nossa intervenção, mas também as limitações e contingências que por vezes marcaram a nossa acção, numa história impossível de condensar em livro e muito menos numa apresentação a um dos seus volumes.
É um património de luta, de ligação estreita aos anseios dos trabalhadores, que fazem da CGTP-IN um instrumento poderoso de defesa dos direitos e de transformação da sociedade. Uma organização de classe, que colhe prestígio junto dos trabalhadores porque estes sabem que aquilo que nos move é a elevação das condições de trabalho e de vida no nosso país.
Um património vivo nas lutas do presente, numa situação particularmente complexa, em que à boleia da Covid-19 se procura retomar e acelerar a ofensiva contra os trabalhadores e aprofundar a transferência de soberania para uma UE que se confirma como organização do capital e ao serviço do grande capital.
Realizamos esta iniciativa num momento em que à necessária prevenção e protecção sanitária estão associadas medidas no plano económico e social, estando em cima da mesa as linhas com que se vai tecer o nosso futuro, seja o Plano de Recuperação, seja o Orçamento do Estado para 2021.
São instrumentos que traduzem uma opcção que deixa o trabalho na gaveta, que consideram quem trabalha e trabalhou peças descartáveis na engrenagem do lucro.
Para a CGTP-IN o futuro do país exige uma ruptura com a política que nos conduziu aos problemas estruturais com que nos debatemos.
Exige a subida geral dos salários e das pensões e a fixação do SMN nos 850€ no curto prazo, para elevar as condições de vida, valorizar as profissões, romper com o ciclo de desigualdade entre quem vende a força de trabalho e os que enriquecem com a exploração. Não aceitamos e lutaremos contra qualquer medida, seja o layoff ou outra, que continue a impor cortes nas retribuições!
Aumentar os salários, os rendimentos de quem trabalha e trabalhou, para garantir a retoma económica e o desenvolvimento do país. Em 2021, nos anos que se vão seguir, a opção é clara: Ou regressamos à política do passado, do PSD\CDS e da troika, em que à recessão se juntou mais exploração com o corte nas retribuições, ou pegamos no exemplo dos anos mais recentes, em que a devolução de rendimentos e direitos implicou mais crescimento.
É tempo de garantir e conquistar direitos e suprimir as limitações dos avanços do passado.
O futuro do país exige a defesa do emprego, o fim da precariedade que é transportada do trabalho para a vida, que nega o presente e apaga perspectivas de futuro para mais de um milhão de trabalhadores.
Exige a revogação das normas gravosas da legislação laboral, das que promovem a individualização das relações laborais e atacam a contratação colectiva, repondo o princípio do tratamento mais favorável e eliminando de uma vez por todas a caducidade. O Governo, que agora reconhece a caducidade como um travão ao desenvolvimento da contratação colectiva, em vez de propor moratórias tem é de revogar, de uma vez por todas, a caducidade que põe nas mãos dos patrões uma ferramenta de chantagem e pressão para a retirada de direitos.
Exigimos também a aposta nos serviços públicos, a dignificação do trabalho na administração pública, impossível quando se negam carreiras e o aumento dos salários.
Exigimos um SNS fortalecido para responder aos problemas do momento e aos que todos os dias o povo carece, uma Escola Pública de qualidade, uma Segurança Social focada na sua missão e não na drenagem de avultadas verbas para o patronato. Estes são direitos que conquistámos arduamente, que fazem parte indissociável da democracia, dos quais não abdicamos!
O país precisa, os trabalhadores exigem e o povo reclama o reforço da presença do Estado, de empresas e sectores públicos que tenham como objectivo a resposta às necessidades colectivas e não a distribuição de chorudos dividendos a meia dúzia de accionistas.
Precisamos de produzir mais, dinamizar novas fileiras produtivas, reindustrializar o país e aproveitar as potencialidades existentes, seja da riqueza que temos, seja da força de trabalho e da sua capacidade transformadora.
É esta a mudança de rumo que se impõe e que falta ao PS, nas opções que tem tomado e também na proposta de OE 2021 que urge alterar.
É na afirmação soberana, no poder e na força do trabalho que reside o futuro do país.
É este o futuro que, com a luta, ajudamos a construir, pelo qual nos mobilizamos e organizamos.
Esta é, também, a forma de homenagear o legado que herdámos e de projectar os direitos dos trabalhadores no futuro de Portugal!
Viva a CGTP-IN!
CGTP-IN
29.10.2020