O Governo afirma que entre Outubro de 2022 (momento da assinatura do Acordo de Rendimentos com UGT e patrões) e Fevereiro de 2024 foram publicados 611 instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho (IRCT), abrangendo 1.086.855 trabalhadores.

Uma vez que os dados referentes a Fevereiro não foram ainda tornados públicos, apenas conseguimos confirmar que entre Outubro de 2022 e Janeiro de 2024 o número de trabalhadores potencialmente abrangidos por IRCT publicados foi de 986.422, devendo ter sido abrangidos 100.433 em Fevereiro (tendo em conta os números do Governo).

O Governo afirma também que é de 2,5 milhões o número de trabalhadores abrangidos por "contratação colectiva dinâmica, ou seja, negociada, assinada e publicada nos últimos três anos”1. Ora, se recuarmos ao triénio anterior comparável (isto é, antes da pandemia entre 2017 e 2019), o número foi superior: 2,7 milhões de trabalhadores2. E recuando ao triénio de 2006 a 2008 eram cerca de 5 milhões, o dobro da situação actual.

De referir ainda que dos 2,5 milhões de trabalhadores abrangidos por contratação colectiva nova ou revista nos últimos 3 anos, cerca de 2 milhões foram potencialmente abrangidos por alterações salariais, o que compara com cerca de 2,1 milhões no triénio de 2017 a 2019 e com perto de 4,6 milhões do triénio de 2006 a 2008.

Mas mais relevante é o facto de apenas um em cada quatro trabalhadores (25,6%) ter sido potencialmente abrangido por contratação colectiva nova ou revista em 2023 e apenas um em cada cinco (20,7%) ter sido potencialmente abrangido por alterações salariais3.

Estes números comparam, respectivamente, com os 72% e 59% alcançados em 2008, o ano com maior percentagem desde 2005 (ano em quando esta estimativa se iniciou).

Quanto aos salários, o Governo afirma que os salários base dos trabalhadores abrangidos por IRCT aumentaram 11,4% entre Outubro de 2022 e Outubro de 2023 (variação nominal), segundo uma análise do Ministério do Trabalho com base nas declarações registadas na Segurança Social e no Relatório Único, um cruzamento de dados que também não é público.

O que sabemos, a partir dos dados oficiais da DGERT relativos à contratação colectiva, é que o aumento dos salários base foi de 6,6% em termos nominais entre Outubro de 2022 e Outubro de 2023 e de 0,1% em termos reais4. E que em Janeiro de 2024 os salários acordados na contratação colectiva tiveram uma perda real de 0,4%, verificando-se assim uma perda de poder de compra.

Os dados referidos pelo Governo provavelmente incluem aumentos superiores aos da contratação colectiva e não resultam directamente desta como se parece querer fazer crer.

Sabemos também que em 2023 os salários do trabalhadores do sector privado tinham perdido 0,6% do seu poder de compra face a 2021, o ano anterior ao início deste período de subida da inflação, porque os salários não acompanharam o aumento dos preços entretanto verificado e a contratação colectiva não deu o contributo necessário por estar manietada no seu alcance pelas normas gravosas do Código do Trabalho, nomeadamente a norma da caducidade.

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Em síntese:

A contratação colectiva, fruto das normas gravosas do Código de Trabalho, tem vindo a perder preponderância.

Não só o número de trabalhadores abrangidos por "contratação colectiva dinâmica”(definição do governo), ou seja, negociada, assinada e publicada nos últimos três anos (2,5 milhões) é menor do que no triénio anterior comparável (2,7 milhões entre 2017 e 2019, antes da pandemia), como é metade do verificado no triénio de 2006 a 2008 (5 milhões).

Em 2023 somente um em cada quatro trabalhadores (25,6%) foi abrangido por contratação colectiva nova ou revista e apenas um em cada cinco (20,7%) foi abrangido por alterações salariais. Estes números comparam, respectivamente, com os 72% e 59% alcançados em 2008.

E os ganhos salariais reais obtidos na contratação colectivas foram residuais, de apenas 0,1% em 2023, sendo já negativos em 2024 com uma perda de 0,4% do poder de compra em Janeiro. 

O impacto da caducidade e das outras normas gravosas da legislação laboral é visivel nos números e afecta todos os trabalhadores, seja por via da fraca cobertura, seja pela própria variação salarial acordada. Em 2023 os salários do trabalhadores do sector privado tinham perdido 0,6% do seu poder de compra face a 2021, o ano anterior ao início deste período de subida da inflação, porque os salários não acompanharam o aumento dos preços entretanto verificado e a contratação colectiva não deu o contributo necessário por estar manietada no seu alcance pelas normas gravosas do Código do Trabalho.

É urgente revogar a norma da caducidade que é usada pelos patrões para bloquear a contratação colectiva, para procurar reduzir direitos e limitar ou negar os aumentos salariais que os trabalhadores precisam! Esta é uma luta a que a CGTP-IN e os seus sindicatos darão continuidade.

Valorizar o trabalho e os trabalhadores, aumentar os salários de forma significativa, valorizar as carreiras e as profissões, garantir os direitos - este é o caminho para garantir uma vida digna a todos os que cá vivem e trabalham, bem como para garantir um Portugal com futuro.

1. O número refere-se a 2021, 2022, 2023 e a Janeiro e Fevereiro de 2024, ou seja, 38 meses. Sem os dados de 2024 são 2,3 milhões.
2. Dados de 2017 a 2019, ou seja, 36 meses.
3. Cálculo da CGTP-IN com base nos Quadros de Pessoal de 2022 e crescimento dos TCO apurado no Inquérito ao Emprego do INE entre 2022 e 2023.
4. Cálculo da CGTP-IN a partir dos dados da DGERT.